seg, 12 maio 2025

Crítica | Brooklyn 45

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Esse é um daqueles filmes que se passa (praticamente) em um único espaço, aqui a ação está restrita a uma sala na casa de Clive Hockstatter (Larry Fessenden – “The Dead Don’t Die”), que, em uma noite de 1945 convida seus três melhores amigos para lhe fazer companhia após ter perdido sua esposa tragicamente. Os quatro são conhecidos de velha data e lutaram juntos na segunda guerra mundial, agora carregam os traumas das situações testemunhadas e não sabem mais viver em um mundo pós-guerra, sem a constante ameaça nazista.

Depois de tomarem alguns drinks, o anfitrião convida o grupo para um séance – cerimônia por meio da qual as pessoas se juntam em um círculo e tentam contatar os mortos – a partir daí as coisas fogem do controlem e fantasmas do passado literais e metafóricos começam a ressurgir para obriga-los a confrontar seus demônios pessoais e fazerem as pazes (ou não) com seus erros. Um dos maiores acertos é trazer como protagonistas pessoas mais velhas de meia idade, com razões mais do que suficientes para quererem se arriscar em um ritual assim, ao contrário do que costuma acontecer nesse tipo de história, geralmente sobre adolescentes curiosos sem nada para fazer que após beberem em demasia se sentem corajosos e decidem brincar com espíritos.

O longa começa de forma bem cativante e misteriosa e a princípio ficamos curiosos para saber qual rumo aquela narrativa irá tornar, já que em dados momentos o filme é sagaz e subverte as nossas expectativas em relação a esse subgênero. Infelizmente, o clima de tensão não se sustenta durante suas 1 hora e 32 minutos e a segunda metade do segundo ato se torna repetitiva, felizmente consegue se recuperar no terceiro ato e reestabelece o ritmo.

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O maior problema de uma narrativa concentrada inteiramente em uma sala, com um número limitado de pessoas é achar maneiras de preencher o tempo de duração do filme e talvez nesse caso, a proposta funcionasse melhor em um curta metragem de 40 minutos. Isso evitaria que os personagens tivessem a mesma discussão reiteradas vezes sem nunca chegarem em uma conclusão diferente, apenas como instrumento para preencher o tempo, o que torna a experiência enfadonha, fazendo com que o filme perca a atenção do público.

Outro detalhe que pode incomodar alguns é a linguagem mais teatral adotada pela obra, bastante diversa da que estamos acostumados a ver no cinema. Para mim isso não chegou a ser um demérito e em nada prejudicou a minha imersão, mas me parece claro que teria sido mais cativante em uma peça de teatro.

No mais, o filme lida bem com os temas propostos, inclusive mostrando que na guerra não há vencedores, e nem todos que lutaram do lado certo são automaticamente “mocinhos”. Após o fim das batalhas, aquelas pessoas condicionadas à violência são incapazes de seguir em frente, em dado momento um personagem alerta outro “a guerra acabou!” e a resposta vem prontamente “quem disse?”. Com o inimigo vencido, é preciso criar novos e continuar brigando, pois só assim os sobreviventes conseguem sentirem-se úteis. Por isso, buscam traidores e espiões a cada esquina, desconfiam de todos a sua volta, e um sotaque diferente já serve para justificar agressões contra quem vem de fora.

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O projeto se aproveita desse cenário para criticar uma prática infelizmente comum até os dias de hoje, principalmente em países que recebem imigrantes, como é o caso dos Estados Unidos, mas do Brasil também. A situação retratada apesar de ser absurda e cheia de fantasmas reflete bem uma realidade de preconceito que ainda ressoa, só que agora com novos “inimigos” escolhidos a dedo por aqueles que tem medo de tudo aquilo que é estrangeiro.

A crítica social funcionaria melhor sem o final em aberto que pode ser usado contra o que parecem serem ideais do próprio filme, faltou sensibilidade aos realizadores para perceber que um desfecho mais fechado deixaria menos margens para análises equivocadas. É claro que um filme não tem culpa da falta de interpretação de seu público, o problema aqui é que o final inconclusivo realmente permitira essa linha interpretativa.

No saldo geral o filme funciona como uma boa adição de catálogo em meio a tantas coisas mal feitas que costumam sair nos streamings nessa época do ano, deve agradar o suficiente os fãs de terror, apesar de estar longe de ser uma obra prima.

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Destaque

Raíssa Sanches
Raíssa Sancheshttp://estacaonerd.com
Formada em direito e apaixonada por cinema
Esse é um daqueles filmes que se passa (praticamente) em um único espaço, aqui a ação está restrita a uma sala na casa de Clive Hockstatter (Larry Fessenden – “The Dead Don’t Die”), que, em uma noite de 1945 convida seus três melhores amigos...Crítica | Brooklyn 45