Jaume Balagueró é um nome conhecido dos aficionados pelo gênero terror, por ter dirigido, ao lado de Paco Plaza, o filme de baixo orçamento e considerável sucesso, Rec. Agora, Jaume retorna com um terror cósmico chamado Vênus, no qual acompanhamos, Lucía, uma dançarina que, após roubar de alguns traficantes, decide se esconder no apartamento de sua irmã mais velha, sem saber que o prédio esconde perigos ainda piores.
Assistindo ao filme, a impressão que fica é a de que o realizador decidiu contar uma história sobre um prédio abandonado, cercado de mistérios e tragédias, no qual coisas estranhas aconteciam que levariam aos eventos do final do filme. O problema – ou o primeiro deles – é que sem saber como colocar sua protagonista dentro desse prédio, criou-se toda uma subtrama envolvendo um cartel de drogas que, após ser roubado, está perseguindo a garota, fazendo com que ela precise se esconder e acabe parando no tal prédio. Ou seja, os enredos não se cruzam de forma orgânica e o casamento forçado não combina, causando uma quebra na fluidez narrativa, o que torna a experiência cansativa.

Quando Lucía chega onde o roteiro a queria o tempo todo, o filme ganha algum fôlego, apesar do drama familiar desinteressante – que nunca é desenvolvido de maneira satisfatória – a atmosfera de desastre iminente que circunda o edifício é bem construída e sua sobrinha, Alba, funciona no papel de criança fofa assombrada por visões. A jovem atriz é bastante carismática e quando está em tela compensa a falta de vitalidade da protagonista vivida por Ester Expósito (Elite).
Uma pena que esses momentos não são aproveitados ao máximo pelo diretor, todas as vezes que o filme aparenta engrenar, a história principal é, novamente, colocada em pausa para dar conta das subtramas desnecessárias e desinteressantes que só se justificam para manter a personagem no apartamento amaldiçoado. Veja bem, a existência de diversos núcleos narrativos não é, por si só, um demérito, a grande questão que pesa contra o filme é o fato desses segmentos serem tão enfadonhos.
Os supostos “vilões” parecem ter sido escritos por uma versão incompetente do Aaron Sorkin, eles aparecem toda hora falando o quanto são maus e fazendo cara de mau, sem nunca serem tão maus de fato, as longas e repetidas cenas em que aparecem conversando vão minando cada vez a mais a paciência de quem está assistindo e só resta o desejo de que o filme retome o foco e volte a acompanhar Lucía e a entidade misteriosa.
A falta de perspicácia mínima dos antagonistas não ajuda a criar sensação de risco, então sempre que a mocinha precisa confronta-los ou fugir deles, a direção apela para muita câmera tremida e edição picotada para fingir urgência. Nas cenas de embate corporal direto, as escolhas vão ficando cada vez mais amadoras, as coreografias de lutas são péssimas e, de novo, a solução encontrada é cortar o máximo possível para tentar esconde-las do público. Até mais da metade do filme a premissa de horror cósmico acaba ficando praticamente escanteada, e só é aludida por meio de flashes de notícias sobre eventos planetários não usuais, esses momentos, assim como todo o restante, também entram em tela de forma completamente aleatória.

No ato final, quando os enredos convergem as coisas começam a melhorar, mas não o suficiente. Pelo menos, o longa passa a ter fluidez, por outro lado o diretor decide, em quarenta minutos, testar o máximo de subgêneros de terror que conseguir encaixar, desesperado para arrancar qualquer reação do espectador, ele apela para uma mistura de body horror, alucinações, jumpscares, torture porn, horror cósmico, cultos/terror religioso, gore e insetos. Tudo colocado de qualquer jeito em um liquidificador, sem nenhuma preocupação em como combinar gêneros e estilos tão diferentes, deixando, assim, tudo com um ar genérico.
A ideia foi, basicamente, atirar para todo o lado e ver se acertava em qualquer coisa, e obviamente acerta! Existem, no meio dessa miscelânea, conceitos de terror bem trabalhados – principalmente quando pende para o gore e body horror – afinal de contas, como dizem, os antigos “até relógio quebrado acerta a hora duas vezes por dia”.
Ainda que uma outra coisa funcione de forma separada, no conjunto da obra elas acabam ficando desconexas e o resultado do todo é fraco. Pense em uma colcha de retalhos, alguns pedaços de tecido são de boa qualidade, o restante além de ter estampas horríveis, ainda é mal costurado, comprometendo a qualidade do produto final, a despeito das peças boas. É verdade que um filme é diferente de uma colcha, mas no caso de Vênus, essa metáfora é bastante elucidativa.