sáb, 23 novembro 2024

Crítica | Uma Prova de Coragem

Publicidade

É preocupante observar produções que chegam aos cinemas brasileiros, cujas fórmulas já estão desgastadas, e cuja habilidade do diretor em lidar com clichês não encontra respaldo visual ou narrativo. Seja no horror, como o caso de Imaginário – Brinquedo Diabólico, ou no drama de superação com cachorro, protagonizado por Mark Wahlberg em Uma Prova de Coragem (Arthur The King, 2024). O filme, inspirado em uma história real, narra a jornada de Michael Light (interpretado por Wahlberg) e uma equipe de atletas competindo no Adventure Racing World Championship. À medida que são levados ao limite da resistência, surge um cão, Arthur, que redefinirá os destinos desse grupo em busca do primeiro lugar. Mas, antes de nos aprofundarmos criticamente na história de Arthur, voltemos nosso olhar para a mais recente temporada de premiações, na qual poderíamos encontrar Nyad, longa protagonizado por Annette Benning e Jodie Foster.

No filme, o protagonismo recai sobre uma nadadora já acima dos sessenta anos que decide nadar de Cuba à Flórida como um projeto pessoal, mobilizando pessoas que destacam sua imprudência em diversos momentos. Apesar das interpretações convincentes das protagonistas, o filme carece de substância em suas propostas, tanto nas sequências mais densas quanto nas discussões sobre o envelhecimento feminino. Uma Prova de Coragem, dirigido por Simon Cellan Jones, também apresenta a história de alguém que almeja participar de um campeonato como parte de um projeto de ascensão, mas cercado por frustrações. Em uma cena, enquanto sua esposa menciona ter abandonado as corridas para se tornar mãe, ele expressa sua arrogância em ter que seguir o mesmo caminho. Além do machismo inerente à fala, evidencia-se o egoísmo desses personagens em busca de validação externa para satisfazer seus egos.

O que diferencia esses dois dramas é a presença do cachorro Arthur, cuja introdução no filme é extremamente melodramática – e não uso este termo de forma pejorativa. Pelo contrário, a emoção é um elemento essencial para o que o filme deseja. Abandonado nas ruas, o cachorro revira latas de lixo em busca de comida, dorme nas noites frias, e enfrenta ameaças de humanos e de outros cães. Os close-ups destacam a tristeza e o abandono em seus olhos, enquanto a trilha sonora delimita sua jornada até encontrar o protagonista interpretado por Wahlberg. Assim, o filme, que inicialmente se apresentava como um drama de superação, se entrelaça com a história de Arthur, resultando em duas narrativas em uma só. Ou melhor, três, considerando o componente de ação presente na corrida de obstáculos por montanhas, estradas, florestas e mar.

Publicidade
Fonte: Divulgação

Todas essas linhas narrativas, embora engenhosas, revelam não apenas a fragilidade de cada uma, mas também a do próprio cineasta responsável, que apenas arranha a superfície da linguagem melodramática durante a meia-hora final, focada na relação entre Light e Arthur. Embora construir um enredo em torno da parceria entre o protagonista e seu animal de estimação seja facilitado pela existência de projetos similares, Cellan Jones parece confundir emoção com sensacionalismo, uma linha tênue que, infelizmente, é transgredida na maneira como as emoções são evocadas e manipuladas na narrativa. A verdadeira emoção deve surgir naturalmente da história, dos personagens e das situações apresentadas, enquanto o sensacionalismo busca chamar a atenção do espectador de forma exagerada e muitas vezes superficial, recorrendo a artifícios intrusivos e manipuladores. O resultado, nesse caso, parece forçado e inautêntico, ao invés de genuinamente emocionante.

Portanto, ao utilizar o termo “preocupante” no início do texto para descrever essa situação, não se trata apenas de uma expressão de consternação, mas também de uma constatação. É evidente o quanto tais produções, seja esta protagonizada por Wahlberg, Imaginário – Brinquedo Diabólico ou Nyad, estão confortáveis em suas zonas de ineficiência. Em outras palavras, a incapacidade de sair da zona de conforto denuncia uma indústria cinematográfica estagnada em seus preceitos. Embora essas obras possam oferecer entretenimento momentâneo – como a busca por lágrimas mencionada anteriormente -, a longo prazo, sua falta de originalidade e coragem para explorar novas possibilidades apenas empalidece uma indústria que, ao se contentar com um possível sucesso comercial, se deixa levar automaticamente. Quando tudo se torna uma fórmula pré-fabricada, o ordinário prevalece. Não se trata de fazer um filme grandioso ou com subtextos complexos, mas sim de abraçar a narrativa com paixão. Infelizmente, algo que este filme e os outros mencionados parecem distantes de alcançar.

Publicidade

Publicidade

Destaque

É preocupante observar produções que chegam aos cinemas brasileiros, cujas fórmulas já estão desgastadas, e cuja habilidade do diretor em lidar com clichês não encontra respaldo visual ou narrativo. Seja no horror, como o caso de Imaginário - Brinquedo Diabólico, ou no drama de...Crítica | Uma Prova de Coragem