sex, 22 novembro 2024

Crítica | Marias

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Marias é um road movie no formato documental que atravessa o Brasil e a Rússia em busca de sua protagonista, Maria Prestes, uma campesina nordestina que viveu na clandestinidade, assumindo diferentes identidades ao longo de sua vida. Sua história, porém, é apenas o início de um retrato mais amplo sobre a luta e a resistência das mulheres ao longo do último século.

Em determinado momento, ainda no início de seu primeiro ato, a apuração jornalística do documentário Marias, ilustrado por uma didática narração que nos acompanha e ajuda a guiar o público do início ao fim de sua narrativa, parecia se desdobrar de uma maneira inquieta, ostentando suas valiosas informações de uma curiosa maneira quase incontrolável, ainda mais após uma apresentação que idealizava, para quem não estava a par do assunto do filme, uma produção que valorizasse as Marias mais importantes de nossa história, o que obviamente não deixa de ser verdade. Porém, quando percebemos sobre quem o longa documental de Ludmila Curi se refere verdadeiramente, tudo torna a fazer sentido e logo nos surpreendemos por, de fato, pouco termos nos deparado com um conteúdo tão extenso a respeito dessa tal figura e como ela é um exemplo nato de representatividade de muitas Marias que já lutaram por justiça, igualdade e liberdade, no nosso Brasil.

Falar sobre Altamira Rodrigues Sobral Prestes, que foi muito além de a “segunda esposa de Luiz Carlos Prestes”, conhecida pelo pseudônimo de Maria Prestes, é se referir a Ana Maria de Jesus Ribeiro (Anita Garibaldi), Maria Quitéria, Maria Bonita, Olga Benário Prestes, Marielle Feanco, e tantas outras Marias influentes ou anônimas que se dedicaram para a lutar por uma causa. Passeando por entre Brasil e Rússia, Marias se encontra em uma dissertação bem construída e até breve, levando em conta seu extenso conteúdo e carga emocional. Mesmo não contando com depoimentos e imagens da própria Maria Prestes, que estava viva durante a realização do filme (vindo a falecer em 2022, por complicações da Covid-19), o documentário mantém uma essência de lutas e destaca constantemente o papel da recifense no comunismo brasileiro pós-Coluna Prestes e no exílio em terras soviéticas, durante a ditadura militar brasileira.

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Imagem: Descoloniza Filmes

A construção de Marias é realizada através de paralelos históricos, principalmente quando o filme leva sua pesquisa para a Rússia, fazendo associação às lutas femininas naquele país e destacando sua força e relevância para com sua história. Ao destacar a estátua da Mãe Pátria, o maior monumento russo que representa uma mulher, Ludmila Curi não só intensifica suas inteligentes alusões às lutas das mulheres brasileiras do campo por direitos, reforma agrária, entre outras causas, como também reflete sobre como o Brasil regridiu na concepção de ter uma mulher no poder, não deixando de destacar o golpe sofrido pela ex-Presidenta Dilma Rousseff, que culminou em seu impeachment e numa era de crise financeira e sócio-política. Com filmagens intercaladas entre documentos de arquivo de reportagens e fotografias jornalísticas, a edição de Marias é um verdadeiro primor e estabelece um casamento funcional com a linguagem didática do documentário.

Mesmo durando pouco tempo de tela, a comparação entre as lutas de Maria Prestes e a Vereadora Marielle Franco, assassinada no Rio de Janeiro em 2018, é um ponto fundamental para a intenficação do projeto, ampliando ainda mais a nossa visão de como a atuação da política carioca se assemelha às lutas das figuras históricas mencionadas pelo filme, com, evidentemente, conquistas já alcançadas, mas ainda com muito pelo qual se deve batalhar.

O registro de Ludmila Curi é um ato político em defesa de todas as Marias, mulheres líderes, donas de casa, trabalhadoras, estudantes, políticas, mães, filhas, esposas, batalhadoras por suas causas.

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