O Auto da Compadecida (2000) é um marco do cinema nacional. A produção inspirada na obra de Ariano Suassuna mistura comédia, drama e elementos da cultura popular nordestina de modo ímpar! O filme retrata, com muito bom humor, a história de Chicó (Selton Mello) e João Grilo (Matheus Nachtergaele) e alia os momentos divertidos que a dupla enfrenta para sobreviver com algumas críticas sociais sobre temas como: corrupção, religião e justiça.
Após 20 anos do lançamento chega aos cinemas, O Auto da Compadecida 2 continuação da obra dirigida por Guel Arraes (Grande Sertão). A sequência mostra o emocionante reencontro da dupla protagonista. João Grilo retorna a Tapeorá e descobre que se tornou uma lenda na região, graças às histórias e “causos” contados por Chicó ao longo dos anos. Usando sua esperteza característica, João Grilo decide tirar proveito de sua fama, embarcando em novas aventuras e artimanhas para se adaptar à sua nova realidade.
A direção da continuação feita por Guel Arraes e Flávia Lacerda (Os Brau) mistura elementos presentes no teatro, TV e cinema para contar sua história. A inovação funciona em alguns momentos. A teatralidade inserida nas cenas funciona ao aproximar o espectador do que acontece, inserindo ele como uma testemunha ocular dos fatos, algo que é diferente do convencional. Porém, o mix de propostas esbarra na sobreposição de estilos, o que enfraquece a narrativa.
Essa mesma teatralidade que insere um tom lúdico e folclórico soa artificial em alguns momentos e dá ao filme um ar de especial feito para a TV, o que pode incomodar alguns (importante lembrar que o filme original foi feito para TV e depois, adaptado para os cinemas). A composição dos cenários, feitos de modo digital, surge de forma desarmônica com os ambientes reais, o que atrapalha a imersão do público na história.
Se a direção apresenta altos e baixos, o mesmo não se pode falar do roteiro escrito pelo quarteto Guel Arraes, Adriano Falcão (A Máquina), João Falcão (Irma Vap – O Retorno) e Jorge Furtado (O Homem Que Copiava) que está afiado e apresenta diálogos divertidíssimos para a história. Devido ao falecimento de Ariano a equipe de roteiristas criou todo o texto do zero, mas ele faz jus ao legado do autor.
O humor típico do primeiro filme, com comentários ácidos e críticas sociais são feitas a todo momento e divertem. Muito desse destaque ao texto se deve ao elenco espetacular e carismático, que atua com tempo para mostrar seu talento e brilhar! Matheus Nachtergaele (Carandiru) retorna ao papel de João Grilo de modo irretocável, como se nunca tivesse deixado de interpretar o personagem. Selton Mello (Irmão Urso) apresenta um Chicó carismático e mais maduro, assim como Virgínia Cavendish (Lisbela e o Prisioneiro) que retorna arrancando suspiros e exalando talento. Além deles vale destacar a presença de Eduardo Sterblitch (Os Outros) como o candidato a prefeito Arlindo e Luís Miranda (Meu Nome Não é Johnny) como Antônio do Amor. Ambos os atores roubam as cenas onde aparecem e divertem o público com seus personagens.
Porém é inegável que alguns elementos apresentados na história surgem para evocar uma certa nostalgia no público. Estes elementos são usados algumas vezes em demasia, o que dá a impressão de que estamos (re)vendo o primeiro filme; e essa repetição pode frustrar a imersão do público que estava ansioso por ver os novos caminhos que a dupla protagonista iria seguir. Por fim, a montagem elétrica do filme acerta ao dar dinamismo a trama, mas peca em apressar algumas situações com cortes bruscos.
O Auto da Compadecida 2 é uma continuação cativante que conta com personagens memoráveis. O elenco se destaca pela química impecável e são, sem dúvida, o ponto mais alto do filme, garantindo risos e momentos de grande emoção.
Se você é fã de comédias, este filme não pode faltar nunca na sua lista.