A Turma da Mônica, criada por Maurício de Sousa em 1959, é um desses ícones da cultura brasileira e realiza um papel fundamental no divertimento, na educação e pedagogia de valores. Com personagens como Mônica, Cebolinha e Cascão, suas histórias diversos temas cujas lições sempre são marcadas. O trabalho realizado pelos quadrinhos vai além da promoção da leitura – ora, é difícil encontrar um jovem adulto hoje que não tenha iniciado os passos da alfabetização com a Turma da Mônica –, com suas ilustrações e narrativas, mas ela sempre parece se adaptar às demandas temporais.
Ao longo dos anos, a obra se expandiu para outras mídias, tornando-se um fenômeno cultural e econômico. Esta última característica, aliás, permitiu que filmes começassem a ser preparados, com destaque aos dois primeiros dirigidos por Daniel Rezende: Turma da Mônica – Laços e Turma da Mônica – Lições. Competentes tanto na articulação das histórias para o cinema quanto na escalação do elenco infantil, ambos os filmes foram sucesso de bilheteria, construindo, assim, uma chance de outros projetos que envolvessem esses personagens na adolescência, mais idosos – como na nova série lançada pelo Globoplay – ou com destaque para personagens como Chico Bento, um dos mais emblemáticos dos quadrinhos.
Fernando Fraiha, diretor responsável por Chico Bento e a Goiabeira Maraviósa, se inspira em diversos quadrinhos de Sousa, para contar a história de seu protagonista e sua amada goiabeira, onde ele pega a fruta sem o dono das terras saber. O que Chico não esperava era que sua preciosa árvore estaria ameaçada pela construção de uma estrada na região, já que, para desenhar a rodovia, será preciso pavimentá-la. Focado em salvar a árvore, Chico Bento reúne seus amigos Zé Lelé, Rosinha, Zé da Roça, Tábata, Hiro e toda a comunidade para acabar com o projeto da família de Genezinho e Dotô Agripino. As qualidades do filme não estão diretamente nas questões estéticas — embora estas também mereçam destaque — mas na forma com que o projeto se mantém genuíno em suas intenções.
Ele é extremamente consciente, não só da trajetória extrafílmica de Chico Bento, um personagem querido, mas também por nunca subestimar o público, mantendo sempre uma abordagem afetuosa. É claro que a atuação de Isaac Amendoim é a principal responsável por isso, encantando desde sua primeira aparição – aliás, desde quando surgiu o primeiro teaser do filme – e fazendo de Chico Bento esse centro de gravidade durante todo o longa, segurando o espectador pela mão e o levando a conhecer todos os meandros da Vila Abobrinha e seus personagens mais fascinantes.
Quando levamos nossos olhares para as outras características do longa-metragem, nos deparamos com uma ambientação que imprime nos personagens e os permitem existirem além da caricatura possível quando se faz uma transposição midiática. Fraiha domina com a linguagem cinematográfica, utilizando-a para criar momentos de humor que fluem de maneira natural, mas também para gerar atritos e expressar ternura – ou as duas coisas ao mesmo tempo, de forma bem dosada. Esse equilíbrio permite que o filme navegue de maneira orgânica no seu ritmo, sem que haja uma dilatação temporal que provoque sensações enfadonhas a audiência.
Além disso, é notável – e destaco este como um dos pontos centrais do longa – como o filme consegue abordar questões sociais e ambientais de maneira pedagógica, sem soar forçado. Embora temas como progresso, desenvolvimento e preservação do meio ambiente sejam frequentemente discutidos nas escolas – lembremos que o público-alvo do filme é infantil –, Chico Bento e a Goiabeira Maraviósa consegue transformar essas questões em um exercício para as crianças, usando a linguagem fílmica. Ao fazer isso, Fraiha e equipe confiam na capacidade crítica e na percepção de seu público, oferecendo mais do que lições, mas um entretenimento acessível, envolvente e criativo. Esse cuidado em não subestimar a inteligência das crianças, ao mesmo tempo em que propõe um diálogo enriquecedor sobre o mundo que as cerca, é uma das maiores virtudes da obra.