sáb, 19 julho 2025

Crítica | Apocalipse nos Trópicos

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É importante não soarmos ingênuos quando estamos falando de um documentário. A ideia de que ele representa a realidade não apenas é datada, como revela uma falta de compreensão da própria natureza humana. Desde que a câmera fotográfica foi inventada, o homem entendeu que a pose diante das lentes é algo essencial para a forma com a qual ele deseja ser percebido pelo outro. A ideia conceitual de algo que se planeja defender, no cinema, passa, claro, pela pose de seus personagens, mas também pela forma com a qual a narrativa é engendrada.

Petra Costa é uma cineasta com um tato muito específico em torno da política brasileira. Se, em Democracia em Vertigem, ela se coloca no centro para pensar a decadência da própria noção democrática, em seu novo documentário, Apocalipse nos Trópicos, disponível na Netflix, ela parte do pós-2016, tentando mapear a história política nacional a partir de uma ótica: o crescimento da religião evangélica. Para isso, ela leva sua câmera até Silas Malafaia, nome influente dessa vertente religiosa.

É então que o documentário parece caminhar em duas frentes muito importantes para a compreensão da linguagem cinematográfica como forma de documento. O ineditismo do que o pastor fala diante das câmeras parece soar como descaramento (“Como ele pode falar sobre compra de parlamentares de forma tão despreocupada?”), mas, na verdade, está diretamente ligado à ideia performática que o próprio sujeito tem diante das câmeras. Ora, ele é alguém que se tornou conhecido por sua influência nas televisões no início do novo século e que entendeu a linguagem das redes sociais rapidamente (Malafaia tem um canal no YouTube há anos e mantém suas páginas nas redes sociais bem atualizadas). Logo, ele não fala algo diante das câmeras sem saber que isso vai gerar algum tipo de repercussão, seja dentro de sua base ou fora dela.

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Quando Petra entrevista Malafaia, ambos têm um acordo tácito, talvez não dito, mas evidente: ele sabe o que ela deseja, e ela sabe o que ele deseja. Portanto, o documentário só é o que é pelo desejo que ambos têm de pautar a discussão acerca da religião — Malafaia, ao tentar dar conta de sua influência (são diversos os momentos em que ele deixa isso claro), e Costa, em um viés crítico.

O entendimento imagético da cineasta é sempre algo interessante a se observar. Notemos, ainda no início, como ela coloca o rosto de um pastor na frente do rosto de uma enorme cédula de dólar que decora a casa de uma família. Por meio semiótico, é evidente seu discurso — assim como no instante em que Malafaia apresenta Bolsonaro como alguém fraco, despreparado e vil. A própria montagem aponta para essas questões; porém, Costa parece querer sublinhar ainda mais a mensagem, sentindo a necessidade de explicar todos os detalhes da geração de suas imagens e de suas ideias.

Há quem aponte a narração da cineasta como um problema inequívoco, criticando seu tom de voz ou oratória. Tais comentários, além de saírem do campo da narração em si, desconsideram o maior problema disso: a didatização do discurso. É claro que todo documentário que almeja tratar de uma situação política precisa trazer consigo seu contexto; contudo, transformar toda imagem em uma constante explicação, como se a mensagem em si precisasse de legenda, empobrece a experiência.

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Mas essa ação, por sua vez, revela o outro lado da linha: a performance da própria diretora dentro da sua esfera político-social. Costa, mais do que ninguém, sabe para quem está falando: uma esquerda que entende as redes sociais como forma de luta, que toma para si pautas que geram burburinho dentro das quatro paredes algorítmicas. Ou seja, Apocalipse nos Trópicos é um filme sobre a religião evangélica feito especificamente para uma parcela específica do público de esquerda, que parece descobrir que o mundo é maior do que pensa por meio do uso dessa linguagem — e que garante cortes nas redes sociais para fomentar ainda mais uma opinião sobre determinada fatia das estatísticas.

Logo, se em termos de linguagem o documento de Petra mantém o mesmo tom de seus outros trabalhos, em termos de discurso ela parece ter entendido melhor a quem se dirige. Talvez essa seja a melhor forma de entender o projeto como algo bem-sucedido.

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