Definitivamente muitos devem se lembrar de quando assistiram ‘Tron’ (1982) pela primeira vez. Um dos primeiros filmes da história a usar de forma extensiva a computação gráfica de forma tão visceral que até hoje é referenciado em obras com temáticas parecidas. Um pouco diferente do clássico dos anos oitenta, a sequência ‘TRON: O Legado’ (2010) foi um sucesso comercial moderado e atraiu os olhares do mundo novamente para a história de Kevin Flynn. Quinze anos depois, a história retorna com Jared Leto, vencedor do Oscar de Melhor Ator Coadjuvante, e Greta Lee, conhecida por ‘Vidas Passadas’ (2023).
Em uma importante missão, Ares (interpretado por Jared Leto) é retirado do mundo digital para conseguir resolver os problemas do mundo real, no entanto, os perigos apresentados pelo novo trabalho serão capazes de fazê-lo desacreditar de suas próprias diretrizes.
Não é segredo para ninguém a crise criativa que o cinema vive, com sequências ou reboots de sagas famosas da sétima arte para tentar atingir um resultado satisfatório de bilheteria em cima dessas histórias já conhecidas do público. Isso tem gerado, obviamente, uma sequência de projetos com pouquíssima preocupação estética ou com a sua forma, com o objetivo apenas de ser simples, manter de forma superficial a essência daquela história e adicionar alguns fan services aqui e ali. ‘TRON: Ares’ acaba entrando nesse bolo também. É um projeto muito mais preocupado nessa atualização da história para os tempos atuais, com a tecnologia atual (vide a menção à Inteligência Artificial na própria trama) e em tentar atrair um novo público enquanto lembra sempre da história original para os fãs dos filmes anteriores sentirem um pouco de nostalgia. Como sempre gosto de discutir em meus textos, todos os elementos que são estereotipados como negativos na arte podem sim ser utilizados numa nova obra. O problema não é um(a) artista usar um clichê em um filme, mas sim se esse clichê está ali apenas por estar ou faz parte da interpretação da obra como um todo.

Ao mesmo tempo que o novo filme faz questão de mostrar logo nas cenas iniciais como o mundo mudou, a tecnologia evoluiu, recursos como a IA chegaram em nosso cotidiano, nunca há propriamente uma discussão relevante sobre o tema, na verdade nem há um esforço do diretor para fazer esse debate na obra, enquanto a obra prefere investir em uma força dramática quase inexistente, forçando laços familiares e personagens baseados em seus traumas do passado da forma mais superficial que já conhecemos do cinema atual. É uma decisão artística bastante conservadora e acomodada, um reflexo bastante didático dessa crise criativa que comentei anteriormente justamente, justamente por não querer se arriscar em algo novo, em uma ideia nova. Pelo contrário, o filme possui uma base que é similar a diversos filmes que já trataram sobre Inteligência Artificial no cinema, principalmente sobre esse processo de “descoberta” em que um personagem não humano (neste caso, interpretado pelo Jared Leto) entende que nunca será igual seus criadores e então decide virar de lado ou ajudar um humano. Não existe nenhuma força dramática ou algo minimamente relevante nesse lado do filme, por mais que seja empurrado um drama familiar aqui, uma crise existencial ali, parece que sempre quer arranjar algo pro espectador simpatizar e não consegue. Por outro lado, os melhores momentos do filme são justamente quando ele ignora essas questões e parte pra ação.
O trabalho gráfico e, especialmente, o sonoro acabam trazendo justamente o que o filme pede desde o começo: uma adrenalina sobre-humana para aquele mundo humano. Os propósitos ali naquele universo, a expansão de como pode ser usada aquela tecnologia e a própria discussão sobre a permanência da existência – ainda que nada aproveitada durante o filme para dar espaço ao fan service e tentativas de relações entre personagens frustradas – só se encontram mesmo durante as cenas de ação pela tensão que elas possuem aproveitando fragmentos dessa tentativa de desenvolver um laço emocional na história. Um grande peso, também, dado a atuação de Greta Lee, principalmente nas cenas em que há mais tempo de tela entre ela e o personagem do Jared Leto, Ares. Leto, inclusive, demonstra realmente ter deixado a carreira o consumir, em mais uma atuação que nem podemos considerá-lo como um robô e sem dar profundidade nenhuma nas cenas em que ele poderia fazê-la, deixando Greta Lee carregar todas as cenas importantes quando está em tela.
‘TRON: Ares’ acaba indo pelo mesmo caminho que o cinema hollywoodiano prefere seguir nos últimos anos e deixando a nostalgia ser mais importante do que propriamente pensar em uma interpretação de arte, mas ainda possui o seu valor em cenas de ação que vão agradar o público geral e os fãs da franquia, com uma boa atuação de Greta Lee para deixar (algumas) cenas com mais peso dramático, ainda que o ponto ideal que o filme almeja fique bastante longe.