A sinopse de Caranguejo Negro, novo thriller pós-apocalíptico da Netflix, é simples e bastante objetiva: Para acabar com uma guerra apocalíptica e salvar a filha, uma militar embarca em uma missão desesperada: atravessar o mar congelado levando uma carga ultrassecreta. O que não é simples é a mistura de sentimentos e emoções que está produção sueca irá causar no espectador.
A trama do filme é baseada no livro Svart krabba, escrito por Jerker Virdborg e publicado em 2002 e apresenta um universo muito próximo do que estamos atualmente vivendo (guerra entre Rússia e Ucrânia). Com um clima bastante sombrio, a história nos apresenta, sem muitos rodeios, um mundo devastado pela guerra. O roteiro de Adam Berg (In), escrito ao lado de Pelle Rådström (Schoolyard Blues) e Jerker Virdborg (Bath House) nos insere num universo realista e que está num extenso conflito. O motivo do início dessa guerra nunca é revelado, e nem é o foco dessa produção. O foco aqui é mostrar o que uma mãe faria para rever sua filha. A personagem de Noomi Rapace (Prometheus) é recrutada por ter uma habilidade rara e serve como guia por esse mundo devastado. Ela e sua equipe precisam atravessar mais de 160 quilômetros de mar congelado, levando um pacote misterioso para dar fim a guerra e salvar milhões de pessoas. A motivação de cada um dos soldados da equipe é revelada com o passar do tempo pelo roteiro, e vemos que alguns tem motivos simples como: cumprir ordens e outros tem razões mais pessoais e nobres para aceitarem essa “missão suicida”. O roteiro ainda adiciona um detalhe especial à trama, que é um jogo de gato e rato entre os personagens, que desconfiam um dos outros à todo momento. Afinal o propósito que os motiva é desconhecido por eles e suas motivações só são reveladas com o passar do tempo. Em quem confiar é um grande mistério, que é muito bem desenvolvido por todo o filme. Por fim os perigos e obstáculos no caminho da equipe são apresentados de modo orgânico e bastante convincentes. As cenas de ação e tiroteio são muito bem filmadas e dirigidas e adicionam ainda mais tensão a situação.
A direção de Berg mostra toda essa missão de modo interessantes e bastante elegante. O modo como ele usa a câmera e alterna os planos é incrível. Além disso, a mixagem de som é espetacular e os momentos de tensão se tornam maiores devido ao som ou a ausência dele. Os momentos mais marcantes dessa produção são quando a equipe está indo para o seu destino e passam por paisagens destruídas e congelada e tem apenas a lua como testemunha de toda aquela destruição. A fotografia é outro detalhe magnífico do filme e a combinação da luz da lua refletindo no gelo dá um toque especial e sinistro ao que vemos em tela. Porém, uma vez que o pacote secreto é revelado a trama começa a perder força, em especial no seu terceiro ato que foge da proposta inicial e se distancia muito do que foi desenvolvido em todo filme. O que é uma pena.
As performances são todas ótimas e nos fazem crer em que estamos vendo pessoas que já estão no limite em um mundo despedaçado pela guerra. Jakob Oftebro (A Herdeira) interpreta um soldado leal aos seus princípios, Dar Salim (Tatort) e Erik Enge (Die Brücke) vivem soldados que se apegam à missão como trampolim para saírem dessa vida de constante luta. O grande coração do filme é Rapace que deseja apenas vencer tudo isso para rever sua filha. A atuação dela é o que salva o final desse filme. O último ato é o calcanhar de aquiles do filme, por apresentar questões de viés filosófico que não são tão bem desenvolvidas.
Caranguejo Negro mostra que a guerra é um inferno que pode inspirar as pessoas a fazerem o inimaginável em prol do que mais desejam. É uma pena que o diretor não tenha levado suas ideias iniciais até as últimas consequências. Mas mesmo assim, a produção é uma ótima adição ao catálogo da Netflix, confira o quanto antes.