sex, 19 abril 2024

Crítica | 007 – Sem Tempo para Morrer

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Terno preto, gravata borboleta, arma em mãos, posição de ataque, cabelo bem cortado, ar sorrateiro; estes são apenas alguns dos pré-requisitos hereditários para considerar-se um 007. Do influenciador Sean Connery, passando pelo sedutor Pierce Brosnan e desembocando no másculo, porém sensível, Daniel Craig, estar neste molde de protagonista em meio a uma franquia quase tão antiga quanto os próprios filmes de espionagem, propicia o reverbério do nome de seu intérprete no mundo do cinema para sempre. Entretanto, a responsabilidade de ser um James Bond sustenta-se por um certo tempo; tornando o feito datado, é preciso mudar de estratégia. No 007 de Cary Joji Fukunaga, a sequência perdura até quando algo necessita ser deixado para trás.

B25_25594_R James Bond (Daniel Craig) prepares to shoot in NO TIME TO DIE an EON Productions and Metro Goldwyn Mayer Studios film Credit: Nicola Dove © 2020 DANJAQ, LLC AND MGM. ALL RIGHTS RESERVED.

007 – Sem Tempo Para Morrer tem de início um Bond despreparado. Vivendo na Jamaica junto de Madeleine (Léa Seydoux) e longe de sua vida como agente, o personagem ainda de Daniel Craig, completando 5 vezes no mesmo papel, é retirado de sua zona de conforto por Felix Leiter (Jeffrey Wright), membro da CIA. Ele busca socorro em Bond para, então, combater uma ameaça global baseada em uma tecnologia tóxica desenvolvida por Lyutsifer Safin (Rami Malek), sendo esta missão capaz de fazer o ex-funcionário do serviço de inteligência americano relembrar (e descobrir) momentos de seu passado. A organização Spectre, por exemplo, trabalhada na obra antecessora comandada por Sam Mendes, volta à tona para dificultar o caminho do espião – que nunca foi fácil, aliás. Logo, criar uma aventura repaginada para os padrões de 007 é uma tarefa árdua, mas mirabolar contratempos estrondosos o suficiente para James Bond ultrapassar exige ainda mais cautela.

Se o trailer de abertura dos filmes 007, com o característico grafismo estético melancólico com ares de videoclipe e cantado por um ícone pop, é aguardado, em Sem Tempo Para Morrer é necessário um pouco de paciência para sua revelação. Antes deste elemento lúdico, está o relevante presságio do que será a obra: embora haja uma análoga subversão de gênero na primeira cena, de ação para um quase terror envolvendo a figura de um assassino, o que se vê são instantes que traduzem a subsequência de um enredo pautado na agilidade constante. Como uma das figuras centrais para o enlaçamento desta proposta, está a trilha sonora de Hans Zimmer, suficientemente dinâmica para elevar o longa-metragem à uma dramaticidade que se encontra com a aventura, transformando cada detalhe em algo grandioso e enaltecendo o que já é monumental. Sem os instrumentais orquestrados elaborados pelo compositor, ver as diversas colisões de carros seria somente ter a visão de, claro, colisões de carros.

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MGM / Universal – Divulgação

Em sua estrutura, 007 – Sem Tempo Para Morrer se constrói em cima de ingredientes observados em toda franquia, ainda que manuseados de modo a fazer com que quem não é fã dos filmes, compreenda a essência e o ritmo pelo menos deste. Calcado no inesperado, a todo tempo são disparadas informações acerca do que será ou poderá ser enfrentado em um futuro próximo, carregando um sentido de urgência em toda e qualquer tarefa de Bond. Não obstante, a ação decorrente disto – a especialidade de 007 – ocorre de maneira bruta, sem sutileza nenhuma mediante as câmeras na mão e os planos e sobre planos, mas artística, tornando até agradável, com auxílio do bom uso da iluminação e da já mencionada trilha sonora, a óptica de transformadores e veículos explodindo. Por mais que caia em uma área irreal ao apresentar, como é típico em obras assim, ocorrências que corroboram com a fantasia de fazer do protagonista (um ser humano), inabalável e inalcançável, esta ideia é comprada ao dar-lhe a credibilidade que um “herói” carece para encontrar seu público. 

O James Bond de Daniel Craig se põe em um local de fragilidade notado desde Cassino Royale (2006), vindo em uma tendência crescente de humanizar um indivíduo programado para ser frio. Visto isto, nenhum espectador compraria uma premissa em volta de um personagem que não sente. O último filme de Craig, portanto, demonstra que o artista poderá descansar em paz quanto a seu legado como um Bond digno do hall de Sean Connery, George Lazenby, Roger Moore, Timothy Dalton e Pierce Brosnan, e merecedor da fidelidade de um público. No longa-metragem, o agente passou seu título de 007 para Nomi (Lashana Lynch), também seguindo na direção de um novo começo. Madeleine, por sua vez, aparenta ser a bond girl mais discreta, enquanto Safin, o vilão mais superficial e robótico.

Foto: MGM/ Empire/ Divulgação

Cary Fukunaga, que já fez trabalhos como Beasts Of No Nation (2015), emprega um efeito reboot: refaz o que já foi utilizado, mas aprimorando um pouco mais. Em comparação com as proezas da franquia 007, como Operação Skyfall (2012) e sua legião de admiradores, o filme não vai além do que o universo de James Bond abrange. Contudo, a reciclagem mantém o estilo, sem deixar decair significativamente o padrão de qualidade das últimas obras da sequência, insistindo para que ela não perca seu fôlego. Mesmo assim, a superficialidade, vinda principalmente do vilão principal, é sentida por meio do alinhamento de várias adversidades, incluindo o ultrapassado porém funcional Blofeld (Christoph Waltz), menos elaboradas por conta do foco em uma maior em dimensão porém menos crível atribulação, tal qual o “cientista” Savin. 

007 – Sem Tempo Para Morrer não é novidade, mas se assemelha a uma. Definido como a despedida do atual James Bond, Daniel Craig, o filme de Fukunaga brinda o espectador com o espírito antigo da franquia 007, no qual uma ação bem elaborada prendia mais a atenção do que questionamentos psicológicos profundos. Embora exista um estudo em volta deste fator com o objetivo de sentimentalizar os personagens, o longa-metragem procura voltar-se para o lado prático, adotando uma postura visual que preza pelo eletrizante. Para Sem Tempo Para Morrer, uma obra de perseguição desta magnitude não pode perder tempo com interpretações inconscientes; ou o público está imerso na ferocidade das brigas, dos tiros, dos tombamentos nas pontes, dos mísseis, etc., ou é melhor buscar por mais calmaria. Até porque, nem James Bond conseguiu alcançar este estado.

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