Daniel Aragão ficou conhecido após a direção de ‘Boa Sorte, Meu Amor’ (2012) e pelo trabalho como montador no documentário ‘O Jardim das Aflições’ (2017), acompanhado das suas opiniões políticas. Ele retorna como diretor agora em ‘A Primavera’, filme que será lançado em 23 de outubro deste ano, junto de Sérgio Bivar em seu primeiro trabalho como diretor.
Em meio a um Recife em colapso, Jeová (interpretado por Luiz Aquino), um poeta marginal e Maria Suzanne, uma jovem em situação de rua (interpretada por Eduarda Rocha), cruzam seus caminhos numa jornada de delírio, arte e sobrevivência, onde a cidade se torna personagem de uma primavera impossível.
Acredito que há sempre o que dizer no cinema, tanto falado, propriamente, quanto dito através de imagens. Principalmente em um cinema com raízes políticas claras e posicionamentos diretos como o de Daniel Aragão, conhecido por suas posições conservadoras, para descrever de forma mínima. Não acho, no entanto, que você apenas sair com uma câmera na mão enquanto o seu protagonista lê poesias e poemas isolados seja uma forma eficiente de dizer o que quer. Na verdade, isso poderia ser ótimo, se a imagem em tela possuísse algum peso para quem está assistindo. Não há na obra, por exemplo, um uso com propósito que seja sobre o centro do Recife. Qual a mensagem que há naquelas imagens? O que há naquela mise-en-scéne para ser sentido pelos espectadores? Em curtíssimos momentos, você consegue associar a imagem e o discurso como uma crítica à metrópole e como ela está decaindo com o passar do tempo, mas nada que se perdure por muito tempo em tela até ser interrompida por outra passagem poética com outro propósito. Ainda dentro dessa tentativa de crítica, existe também a questão moral que extrapola qualquer interpretação que eu enxergue no filme quando pessoas em vulnerabilidade social e prostitutas são filmadas e retratadas em tela de forma exploratória, nessa tentativa ambiciosa de ser algo “poético” sem limites.

Os diretores acreditaram, pela montagem final, que estavam produzindo uma obra digna da Nouvelle Vague francesa, quando na verdade estavam apenas fazendo um experimento (que ainda acredito ser uma maneira muito generosa de chamar esse projeto) sobre poesia e cinema. O ponto forte do filme acaba sendo as atuações, especialmente de Luiz Aquino e Eduarda Rocha que entregam um peso gigante em cena e dão o diferencial do filme. As cenas com a presença de ambos acaba sendo uma força maior para toda essa tentativa de encenação mais profunda, em momentos que, aí sim, as ruas do centro da cidade viram um local quase espiritual, um tapete para aqueles pensamentos e reflexões desfilarem. Uma pena que essas divagações fiquem por aí mesmo.
‘A Primavera’ possui uma grande descoberta em ter Luiz Aquino como protagonista, mas as poesias ditas por ele em uma sequência de imagens vagas acaba não falando nada sobre o Recife e muito menos sobre a obra. Uma tentativa de um cinema conceitual com reflexões atuais, mas que acaba virando um mar de vazios e tentativas ambiciosas.