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Início Críticas Crítica | Às Vezes Quero Sumir

    Crítica | Às Vezes Quero Sumir

    Depressão e niilismo são temas principais de drama cujo a ruína é a tentativa falha de humor ácido que deveria servir de diferencial para a narrativa

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    Às Vezes Quero Sumir (Sometimes I Think About Dying) é uma comédia dramática que gira em torno de Fran (Daisy Riddley), uma jovem que tem pensamentos sobre a própria morte e vem passando por problemas pessoais. Em um inusitado momento no trabalho, ela faz o novato da empresa, o cinéfilo Robert (David Merheje), se interessar por seu humor ácido, o que acaba resultando numa inesperada amizade entre os dois. Porém, a medida que o relacionamento tentar crescer, demônios internos de Fran impedem que isso se torne algo a mais.

    Não é novidade, muito menos um tabu, que pensamentos sobre morte e a tradicional prática niilista em rejeitar a auto aceitação, assim como sua própria existência, que passar a ser meramente trivial, pairem sobre a mente de pessoas com depressão e ansiedade. O funcionamento mental de quem sofre com essas condições vem, cada vez mais, ganhando ênfase na sétima arte, o que é de extrema importância e gratificante, quando realizado com sabedoria.

    O cinema, como janela para conhecimentos e reflexões a respeito de temáticas sensíveis e realidades difíceis enfrentadas por indivíduos cujo a saúde mental está debilitada, vem procurando cada vez mais uma exploração com esmero e cautela desses determinados temas, que, indiscutivelmente, vierem mais a tona por conta do período de calamidade que recém passamos com a pandemia da Covid-19. Às Vezes Eu Quero Sumir (Sometimes I Think About Dying) é uma dessas produções que procuram revisar com os devidos cuidados as condições da mente humana que sofre com a depressão, tendo em mãos um prato deveras cheio de conteúdo e tamanha responsabilidade para o desenvolvimento da narrativa. Porém, escolhas questionáveis e uma visível e incômoda pressa em entregar todos seus conflitos e soluções de mão beijada.

    Imagem: Synapse Distribution/Reprodução

    Por mais dignas que sejam as intenções do argumento e roteiro de Stefanie Abel Horowitz e Katy Wright-Mead, tendo como base a peça teatral “Killers”, de Kevin Armentto, Às Vezes Eu Quero Sumir escorrega, não drástica, mas consideravelmente, em como explorar os pensamentos mórbidos da protagonista Fran (Daisy Riddley mais uma vez provando sua aptidão para o drama) e em estabelecer uma conexão mais convincente, ou natural, entre ela e os demais personagens. Claro que o longa é decidido em mostrar os desafios dos relacionamentos de pessoas com depressão com as demais, e tenta utilizar de uma pesquisa minuciosa, provavelmente baseada em vivências da própria diretora Rachel Lambert (I Can Feel You Walking) para parecer o mais fiel possível, conseguindo, inclusive, passar para a tela de cinema, com sensibilidade, essa dura e nociva realidade. Porém, a junção entre o drama proposto e um humor ácido quase inexistente, que funciona apenas para tapar lacunas e do roteiro e estabelecer diálogos no mínimo questionáveis entre seus dois personagens centrais, acaba por desconectar o filme de sua proposta. Podemos dizer que, há momentos em que a direção de Lambert, compromissada em entregar justamente o que o título da produção já se auto explica, não encontra uma harmonia com o texto, que deseja resolver todas as situações e conflitos apresentados da maneira mais simples e breve possível.

    Por outro lado, em Às Vezes Quero Sumir, existem leves e discretas investidas em subtemas que exploram o niilismo sob um olhar pessimismo a respeito de nos prepararmos tanto ao longo das nossas vivências, isto é, com trabalhos, cursos e planejamentos, para, no final, recebermos em troca um revés da vida, como é mostrado no drama da personagem Carol, interpretada por Marcia DeBonis (De Repente 30), que dá um toque especial à carga dramática da trama, apesar de ser rápido e não tão impactante como deveria. A direção de Rachael Lambert procura utilizar de recursos que intensificam o tom frio e solitário do longa, principalmente nas sequências em que Fran tem seus pensamentos mórbidos. Enquadramentos mais fechados e detalhados nas expressões da personagem vivida pela inigualável Daisy Riddley também evidenciam a sensibilidade da diretora para com a obra. Em sequências envolvendo Robert, que é interpretado pelo ator e comediante David Merheje que está definitivamente confortável em seu personagem e atribui a ele tantas camadas quanto a protagonista de Riddley, podemos observar uma sutil mudança atmosférica para algo menos pesado, estabelecendo um contraste bem aplicado entre as energias dos dois personagens.

    Imagem: Synapse Distribution

    O elenco de apoio de Às Vezes Quero Sumir não ganha um devido destaque implicitamente idealizado nos primeiros minutos da trama. Era de se esperar um trabalho de diálogos e situações mais detalhados entre os tantos secundários e a protagonista, com exceção da boa sequência já mencionada envolvendo a personagem de Marcia DeBonis. A metragem curta e o ritmo por vezes acelerado de maneira nem um pouco assertiva prejudicam a ideia de atribuir situações e boas ideias de dramas paralelos envolvendo todos os personagens apresentados na mesa de reunião da empresa onde Fran e Robert trabalham, logo no início do filme.

    É inevitável sentir a ativação de gatilhos com Às Vezes Quero Sumir, principalmente nos momentos finais do longa, onde, felizmente, a investida no leve e forçado humor é deixada de lado e vem à tona diálogos maduros e um desfecho já esperado, porém que não deixa de emocionar. Com boas ideias, o longa estrelado e produzido por Daisy Riddley só não as desenvolve sabiamente por conta de ideias desajustadas do roteiro.

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