dom, 28 abril 2024

Crítica | BlackBerry

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O cineasta canadense Matt Johnson gosta de retratar o ambiente masculino. Parte disso, ele recorda, se deve a convivência com homens cujos interesses eram bem específicos, como videogames e jogos de tabuleiro. Os protagonistas de seu mais novo filme BlackBerry poderiam facilmente ter integrado aquele grupo. Mike Lazaridis (Jay Baruchel), um geek da informática, e Doug Fregin (Johnson), um cinéfilo de carteirinha, criaram o smartphone nos anos 90. Com o auxílio do empresário Jim Balsillie (Glenn Howerton), eles conquistam o mundo até outro gigante da indústria aparecer para esmagar a marca. Atraído pela mera existência dessa façanha, o diretor conta a história do utensílio por meio da relação entre o trio de idealizadores. Dramas à parte, o que funciona mesmo é a linguagem solta atrelada a comédia, aqui responsável por aproximar o espectador das personagens e despertar seu interesse momentâneo em conhecer uma trajetória decrescente de sucesso.  

Toda cinebiografia dramatiza situações a partir de fatos. Dito isso, a popularidade de ficções sobre celebridades, figuras políticas ou até mesmo produtos depende não só do apelo do objeto retratado com o público, como também da capacidade criativa dos realizadores de torná-los mais atraentes ao cinema. No caso de BlackBerry, a inventividade se traduz na abordagem humanizada, a qual parece mais interessada em acompanhar como Lazaridis, Fregin e Balsillie se comportam no âmbito profissional do que pontuar marcos históricos na linha do tempo do dispositivo. São raros os momentos onde o filme deixa os escritórios e salas de reunião para mostrar fragmentos da vida íntima dos indivíduos e analisar como a sociedade lidou com determinada invenção tecnológica. O ponto central está na motivação por trás do ofício de cada um, seja ela o simples ato de criar ou a busca desenfreada pelo poder.

Com o intuito de nos convidar a participar daquele cotidiano, o diretor recorre ao dinamismo de uma linguagem que mistura documentário e reality show. Desde o princípio, uma câmera na mão dita o tom propositalmente amador ao utilizar enquadramentos livres na maioria do tempo. A esse estilo “mosca na parede”, no qual as ações são registradas da maneira mais objetiva possível, também podemos atribuir um forte senso de validação do real, como se, ao abrir mão de firulas estilísticas, a filmagem crua fosse mais honesta e factual do que as demais. Contribuindo para a construção do realismo encenado, marcam presença os movimentos de câmera desajeitados como o zoom que se aproxima e distancia subitamente. Tal recurso, muito difundido pelo sitcom The Office, pontua o riso do espectador por meio do foco em elementos específicos enquanto causa constrangimento a partir de reações exageradas das personagens.

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O humor físico, aliás, é o grande trunfo do filme. Na maioria das vezes, ele se baseia no contraste improvável entre o universo geek e o empresarial, fazendo uso de estereótipos para ridicularizá-los na mesma medida. De um lado, Mike e Doug representam o nerd clássico, desde os óculos ao apreço pela tecnologia e cultura pop. A graça está justamente em assistir a dupla juntar moedinhas de uma carteira das Tartarugas Ninja ou no silêncio constrangedor que se instaura quando alguém derruba o cartaz no meio de uma apresentação formal. Em contraponto, Jim personifica o típico lobista de Wall Street com postura ereta e ternos sempre bem alinhados. Apesar disso, seus melhores momentos se devem à personalidade explosiva, evidente nas cenas onde ele quebra telefones durante acessos de raiva ou vocifera com os colegas de trabalho ao mínimo sinal de incompetência.

De acordo com Johnson, existe algo especial em rir dos três protagonistas e ainda assim, se impressionar com o impacto de sua invenção na cultura. Após uma sessão de BlackBerry, a primeira parte dessa sentença se prova verdadeira, já a segunda, nem tanto. Embora divertido e cativante, o filme nunca consegue ser profundo o suficiente para gerar uma reflexão a respeito da nossa relação com a tecnologia e responder porquê nos tornamos tão dependentes dela. Seu mérito se restringe a despertar uma curiosidade irrisória no público que, no máximo, pesquisa no Google pela foto dos reais responsáveis pela criação do venerado smartphone. No entanto, ao perceber que eles voltaram ao status de perdedores, não há mais para onde ir. Em um período no qual a narrativa da prosperidade se repete incansavelmente, quem realmente inspira são que parecem nunca declinar.

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