O novo filme estrelado por Amy Adams conta a história de uma mulher que abre mão de seu trabalho como artista quando se torna mãe, para poder cuidar de seu filho e da casa, enquanto o marido trabalha fora. Seu trabalho nunca é valorizado pelo esposo, que apesar de ter um emprego, se permite aproveitar períodos de descanso e lazer, ao passo que ela se dedica integralmente às obrigações maternas, cuidando praticamente sozinha da criança, além de realizar todos os serviços domésticos, negligenciando suas próprias necessidades básicas e hábitos de higiene em prol da família, que não aprecia seus esforços.
Quando sua rotina repetitiva e estressante se torna demais para ela, a mulher encontra uma válvula de escape na crença de que poderia se tornar uma cachorra durante a noite. Na pele do animal, ela encontra a liberdade que lhe falta em seu lar, podendo correr livremente a céu aberto.
Ao passo que sua insatisfação cresce, ela se recorda, cada vez mais, de sua mãe, e dos sacrifícios feitos por ela para cria-la, incluindo a promissora carreira de cantora da qual abriu mão pela filha. Presa em um ciclo que não consegue quebrar, essa insatisfação se transforma em raiva e ela precisará tomar algumas decisões difíceis para recuperar o controle de sua vida, sem destruir sua família.
O filme explora uma visão da maternidade que até pouco tempo atrás não era muito amplamente discutida, buscando romper com um ideal romantizado e ultrapassado de que tudo seriam flores e momentos de ternura. O debate proposto, apesar de válido e instigante, é tratado no filme de forma bastante superficial.
O pior é o tanto que a diretora, Marielle Heller, não confia na capacidade de interpretação do público. Tudo vem excessivamente mastigado, com diálogos expositivos e uma narração em off, que inutiliza o trabalho da competente Amy Adams, a qual tem seus melhores esforços desperdiçados, já que as emoções que ela se empenha em transmitir, são também prontamente narradas. Não bastasse não se aprofundar nas discussões propostas, a diretora ainda não deixa espaço para qualquer sutileza, fazendo com a que 1 hora e 40 minutos demorem mais do que alguns filmes de 3 horas.
É uma pena, porque algumas cenas têm boas composições e causam verdadeiro desconforto. Infelizmente, todos os momentos inspirados, são explicados logo em seguida, quebrando qualquer possibilidade de emoção genuína. Os diálogos que começam promissores, eventualmente se estendem até perderem toda a nuance e virarem uma aula. Até a conexão da protagonista com outros personagens acaba prejudicada em dados momentos, por esses diálogos empobrecidos, que não transmitem trocas autênticas.
Os melhores momentos do filme ficam por conta dos encontros com as amigas que ela conhece em atividades para crianças, como o “book baby”, com quem ela parece conseguir relaxar, sem precisar fingir que está tudo bem.
Outro ponto que me agrada bastante, é o fato dos protagonistas não terem nomes, seu anonimato faz com que sirvam como representação de todas as famílias nucleares naquela situação, e não só a família retratada no filme. É esse tipo de sutileza que teria sido beneficiado o resultado final da obra. O que parece é que ao adaptar o livro base, a diretora-roteirista não quis abrir mão de nenhuma frase de impacto. O problema é que a linguagem cinematográfica é completamente diferente da literária e consegue passar sua mensagem através de boas atuações e composições de imagens, podendo se tornar enfadonha pelo excesso de narração, como acontece nesse filme.