sáb, 20 dezembro 2025

Crítica | Emily em Paris (5ª temporada)

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Há um paradoxo curioso em Emily em Paris: depois de cinco temporadas no ar, a série ainda funciona como se estivesse em seu eterno primeiro mês. Emily muda de cidade, de namorado, de cliente e de figurino, mas o tempo quase não deixa marcas. Dentro da lógica interna da narrativa, ela está em Paris há algo entre um ano e meio e, no máximo, dois anos. Ainda assim, tudo o que ficou para trás simplesmente evapora.

O noivo da primeira temporada, a chefe americana grávida que motivou a mudança, o casamento que ela veio “organizar à distância”, qualquer vestígio de família ou saudade dos EUA desaparece sem cerimônia. Não é descuido. É regra.

Em Emily em Paris, pessoas entram e saem como campanhas. Cidades funcionam como cenários intercambiáveis. O passado não pesa porque peso exige consequência, e a série sempre foi uma fantasia sem lastro, mais interessada em movimento do que em memória.

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Talvez por isso seja tão difícil odiá-la de verdade. Há quem nunca tenha comprado a proposta de Darren Star, quem tenha amado e cansado, quem tenha detestado a temporada com cara de despedida e, claro, quem siga amando tudo sem ressalvas. A quinta temporada ocupa um lugar curioso nesse espectro. Ela não converte detratores nem resgata antigos fãs com promessas vazias, mas parece, pela primeira vez, consciente de suas próprias limitações.

E isso faz diferença. A nova leva de episódios funciona melhor justamente porque a série parece cansada de si mesma. Pela primeira vez, os conflitos não se resolvem apenas com charme, looks improváveis ou pitches milagrosos. Muita coisa dá errado. E, em um universo que sempre viveu de correção imediata, permitir que algo fracasse sem conserto automático soa quase radical.

Deixamos Emily em Roma e é lá que a reencontramos. A cidade surge cheia de promessas e cenários estupendos, mas rapidamente se revela excesso. Emily tenta ser tudo ao mesmo tempo: chefe de escritório, gestora de uma marca familiar, namorada dedicada, profissional incansável. Pela primeira vez, isso não funciona. O colapso do projeto italiano não acontece por incompetência, mas por saturação. O escritório fecha, os clientes vão embora e a série não corre para apagar o incêndio no episódio seguinte. Apenas deixa o fracasso existir. Dentro da lógica de Emily em Paris, é um gesto grande.

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Quando a narrativa retorna a Paris, o tom muda sutilmente. A série entra em um modo quase melancólico de acerto de contas. Emily e Mindy (Ashley Park) encaram fraturas reais em uma amizade que sempre pareceu indestrutível por conveniência. Sylvie (Philippine Leroy-Beaulieu), sempre soberana, enfrenta algo que nunca soube administrar: vulnerabilidade sem controle. O sucesso profissional passa a coexistir com colapso pessoal, sem que um anule o outro.

Gabriel (Lucas Bravo), curiosamente ausente, deixa de ser obstáculo narrativo e passa a existir como silêncio. Sua ausência pesa mais do que sua presença constante das temporadas anteriores. Pela primeira vez, ele não organiza a vida emocional de Emily apenas por estar ali.

É nesse ponto que surge a contribuição mais espirituosa — e talvez mais honesta — da temporada: a participação de Minnie Driver. Sua princesa-influencer, herdeira por título e endividada por realidade, entende perfeitamente o jogo em que todos fingem não estar jogando. Ela sabe que status é performance, que dinheiro é narrativa e que tudo, no fundo, precisa render conteúdo. Minnie exagera o tom, saboreia o absurdo e transforma o vazio em algo deliciosamente cafona. Por alguns momentos, parece que Emily em Paris vai rir de si mesma de verdade. Não vai longe demais. O produto ainda precisa funcionar. Mas a consciência está ali, piscando.

O ponto de virada emocional chega com a possibilidade de um novo noivado. O pânico de Emily não é medo de amar, é medo de desaparecer dentro de uma vida que não escolheu. O rompimento não é fracasso afetivo, é limite. Pela primeira vez, ela não se dobra para sustentar um relacionamento que exige abdicação constante.

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Nada disso transforma Emily em Paris em uma série profunda. O capitalismo segue sendo seu idioma nativo. O product placement continua orgânico demais para virar crítica. Pessoas ainda aparecem como oportunidades antes de serem pessoas. Mas a quinta temporada entende algo essencial: não há mais novidade possível sem reconhecimento.

Emily sabe quem é, onde pertence e o que não está disposta a sacrificar, nem por amor, nem por carreira, nem por narrativa. Isso dá à temporada um ar de encerramento antecipado. Se a série terminar na sexta, não soará abrupto. O que vem agora não é mais crescimento. É escolha.

Emily em Paris finalmente aceita que não pode mais ser apenas fantasia. E, curiosamente, ao fazer isso, nunca perdeu o charme.

A quinta temporada está completa e disponível no catálogo da Netflix.

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