sex, 22 novembro 2024

Crítica | Ghostbusters: Mais Além

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O impacto emotivo causado pela nostalgia parece nortear os caminhos tomados pelas recentes produções hollywoodianas. É certo que o retorno de franquias aclamadas e icônicas, em especial às de grande sucesso nos anos 70 e 80, oferece relativa segurança na questão financeira para os estúdios, mas não garante suprir a (superficial) necessidade do público de ter um resgate sentimental de uma época já não mais vivida.

É dessa vontade de passado que surge o medo de andar para frente. O dogma sagrado de emular aquilo que fez sucesso, não por uma forma de jogar seguro, mas de evitar a repressão do fã frustrado, provocou com que sagas como Star Wars desses passos largos para trás na tentativa de “consertar” aquilo que não se encaixava no gosto do público – Ascenção Skywalker pior errata da história. Trabalhar com fãs está virando a nova métrica do cinema americano, principalmente quando entra em terrenos tombados pela cultura pop, como no caso de Caça Fantasmas.

Cercada de reações absurdamente machistas no último filme por causa do elenco feminino, a franquia estava presa ao saudosismo de suas figuras como Bill Murray e as piadas de cunho sexista. Cabe saber qual caminho tomaria agora. Para o bem ou para o mal, a versão feminina dos caçadores sobrenaturais propunha uma discussão bastante interessante sobre o contexto que se criou a franquia e suas práticas – como não lembrar da terrível cena que um fantasma faz sexo oral em um dos integrantes. O fato é que o movimento feminista no cinema ganhou força e esse tipo de “piada” não poderia ser mais reproduzida para nerds de 40 anos. Resta, então, apelar para o suco de nostalgia e enfiar goela a baixo o lembrete de ser uma das franquias mais rentáveis do cinema.

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Sony Pictures/Divulgação

Apostando na falta de cerimônia para demonstrar a que veio, Ghostbusters – Mais Além (a americanizada é para dar unidade a franquia) encaminha para ser uma história de nova geração como bem vimos em Star Wars: O Despertar da Força. Enquanto o longa de J.J Abrams tentava fazer ser a cópia de Uma Nova Esperança à sua maneira, Mais Além estaciona no constante material auto referente e impõe ao espectador receber de bom grado as mais descaradas sacadinhas já vistas em um filme. Chega a ser ofensivo o suspense em torno da revelação do Ecto-1 em três cenas que só servem como simulação de masturbação imagética. Se existe algum limite aceitável em forçar algo, Mais Além vai até o limite, só para depois ultrapassá-lo, ou melhor, ir “mais além” do permitido.

Não basta apenas gritar aos quatro cantos sua vontade de reverenciar toda uma época, mas faz isso de maneira tão presunçosa que parece duvidar da capacidade do fã de assimilar a (repetida) proposta de exaltar certos elementos de forma evidente. O diner, por exemplo, tem toda uma construção visual tradicionalista com música, neon e toda visão escancarada de um Estados-Unidos mais ostensivo. Seria, se fosse o caso, relevante dentro da atemporalidade proposta pelo filme; só que, de novo, demonstra-se como mais um exercício de referências vazias e desesperadamente ansiosas para prender o espectador cativado pela fagulha de nostalgia.

Sony Pictures/ Divulgação

O consolo oferecido passa a dominar todos os âmbitos e suas configurações são moldadas para dar destaque aos icônicos objetos conhecidos. Tem-se a clara intenção de manipular cada ação para que seja inserido algum item dentro da narrativa, como a armadilha de fantasmas ou as armas laser – de início um item místico e reverenciável, depois set piece. De fato, são momentos esperados por quem aguarda o apelo dentro da ideia de conforto, só não deixa de ser completamente antinatural e um pouco fora de contexto quando esses elementos entram em destaque. Talvez seja parte do reconhecimento do diretor Jason Reitman com essa demanda insalubre de trabalho e a faça disso algo realmente transcendente dentro do longa.

Apesar desse fator minimamente interessante, falta o controle no (mau) serviço de piscadinhas gratuitas e no que isso reverbera. Mckenna Grace fica totalmente refém da hipotética silhueta de Harold Ramis e em nenhum momento isso é escondido. Pelo contrário, os diversos close ups tentam a todo custo evocar a imagem do falecido ator em um ato desrespeitoso com a atriz e sua personagem. Fica até difícil compreender em qual posição quer se situar nesse meio entre agrados descompromissados e um projeto mais ambicioso.

Do outro lado dessa projeção, Paul Rudd representa o fã do primeiro filme inserido num ambiente desinteressado com o passado. Suas falas denotam o conhecimento de toda a mitologia dos caça fantasmas como recurso de sustentação do universo, reduzindo-o a uma participação instruída a cuspir ainda mais referências numa irritante persistência de se mostrar um entendido da cultura dos anos 80. Até quando encarna o desejo virtual do fã de encontrar os monstros famosos da série, resume-se a ser um boneco plástico para gerar a maior quantidade de identificação possível (curioso ser um homem branco nesse caso).

No que consta esse desastre, poderia ao menos se dar ao trabalho de resgatar a coloração viva dos filmes originais em vez de acinzentar tudo nessa fixação doentia que Hollywood tem com cores chapadas e sim vida. O máximo de cor que se enxerga são nas cenas de pôr do sol que são reflexo de outra tendência “artística” de separar certos filmes por momentos contemplativos. Não existe o menor interesse em ambos. Se a proposta era fazer uma salada de referências, usar de uma alface orgânica, verdinha e sem agrotóxicos ajudaria na digestão e na gastrite pós-filme.

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Jornalista que se aventura no mundo da crítica de cinema. Gosto de café e filme em preto e branco.
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