qua, 18 dezembro 2024

Crítica | Joias Brutas (Uncut Gems)

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Quem assistiu Bom Comportamento, celebrado filme indie de 2017 protagonizado por Robert Pattinson, sabe que pode esperar dos irmãos Josh e Benny Safdie, as mais altas doses de nervosismo e tensão a partir de elementos até bem primários. Em seu trabalho mais recente, Joias Brutas, produzido pela A24 e distribuído universalmente pela Netflix, a dupla de diretores norte-americanos sobe dois degraus nessa proposta de neurose, a partir de um conceito que  naturalmente intensifica suas pretensões de efeito. 

Em termos de trama, os irmãos, também roteiristas, continuam apegados a premissas muito básicas: aqui, o joalheiro Howard – interpretado por um Adam Sandler em um papel desafiador – adquire uma pedra não lapidada da Etiópia e, após oferecê-la a um de seus clientes mais célebres, entra numa espiral de dívidas que pode lhe custar sua vida. Ou seja, para esse roteiro e essa direção de uma linhagem quase maníaca, Howard é como se fosse uma mola que os Safdie ficam sádica e sarcasticamente esticando e comprimindo em doses cada vez maiores. São tantas roubadas nas quais o próprio protagonista se mete que, com toda a seriedade imposta, a coisa ganha uma comicidade alucinante; e nada disso tem a ver com o histórico do ator com o besteirol.

Os Irmãos Safdie estão claramente mais conscientes do seu jogo estilístico aqui e, também, plenamente dispostos a evidenciá-lo – seja através de uma estabilização maior dos planos, seja na circularidade proposta pela história. Eles fazem um belo equilíbrio entre um thriller mais cru no seu tratamento com a violência e uma pseudo-comédia de erros, sem que nenhum dos dois lados se sobressaia. Adam Sandler coopera bastante para tornar a persona de Howard aceitavelmente estúpida, cheio de risadas nervosas e olhares que transmitem raiva, tristeza e medo numa mesma medida.

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De um ponto de vista estilístico, a técnica de misturar uma realidade de aspecto visual fantasioso funciona de forma tremendamente original em Bom Comportamento por ser um trabalho mais interessado no crescendo da narrativa do que na repetição. Havia um contraste muito inovador entre a desconstrução formal da câmera na mão e o uso da saturação visual – componente fundamental para exprimir a ansiedade do texto. Por mais coerente que seja no seu balanceamento de forma e conteúdo, portanto, Joias Brutas não consegue esconder a sensação de enrolação da história no segundo ato. Existe uma preocupação desnecessária com subtramas que, confortavelmente, passam a impressão de profundidade. O melhor do filme está em sua crescente de tensão e sua imprevisibilidade situacional – que culminam em um ato final eletrizante – e não necessariamente em sua circularidade ansiosa. 


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André Guerra
André Guerrahttp://estacaonerd.com
Recifense, jornalista, leonino consciente, cinéfilo doutrinador, agnóstico pagão e em constante desconstrução.
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