Publicidade
Publicidade
Início Críticas Crítica l O Projeto Adam

    Crítica l O Projeto Adam

    Publicidade

    Tornar-se alguém diferente está no script da vida. Crescer, amadurecer, evoluir e progredir faz parte do curso natural de um ser humano, que vira e mexe se vê preso em seu passado ou premeditando seu futuro. Foi por meio deste último costume, aliás, que pudemos encontrar em De Repente 30 (2004) e Quero Ser Grande (1988), por exemplo, sua concretização; afinal, quem, quando criança, nunca se imaginou adulto? Agora, e já nesse estágio, no qual o imaginário infantil cria todo um conceito de realização plena, fosse preciso regressar aos seus primórdios? Bruce Willis foi de encontro com o Russ (ele mesmo) de 8 anos em Duas Vidas (2000), e Ryan Reynolds recorreu ao seu eu de 13, porém inserido em um sci-fi que dialoga com a ideia das consequências vindas de antigas conjunturas. O Projeto Adam (2022), de Shawn Levy, leva em consideração os desdobramentos que as dobras do tempo podem acarretar.

    Netflix/Divulgação

    O pré-adolescente Adam (Walker Scobell), não se dá bem na escola e possui problemas com a mãe, Ellie – a veterana no papel de maternidade, Jennifer Garner -, salientados após a morte de seu pai (Mark Ruffalo). Entretanto, em 2050, o Adam versão madura (Ryan Reynolds) precisará de seu protótipo mais jovem para quebrar a rota espaço-tempo e evitar que o pior futuramente aconteça. Para isso, retorna a 2022 e recruta a si mesmo com 13 anos, iniciando assim uma jornada de junção familiar, redenção e aparatos tecnológicos mesclados com um charme a la anos 80. 

    Referenciado pelos clássicos, O Projeto Adam discorre sobre elementos que grifaram a ficção científica, desde as logomarcas de Star Wars, os sabres de luz, até o brilho das estrelas no céu luminoso de E.T. O Extraterrestre (1982). Apesar do acerto em mirar em longas-metragens icônicos sem ter a presunção de igualar-se a eles, a obra também se beneficia da próprio desinteresse em alcançar, nesse momento, o patamar de sci-fi modelo, e afasta a concepção de filmes como Interestelar (2014), de Christopher Nolan, que necessitam de um universo de extrema complexidade para existirem. Para o trabalho de Levy, no entanto, bastam algumas explicações acerca das razões das repentinas aparições e dos métodos e vias utilizadas na viagem no tempo, didaticamente feitas para que o público absorva e o Adam modo pré adolescência compreenda, dado que as maiores informações são fornecidas ao menino. 

    Contudo, a história que circunda as naves espaciais e utensílios neon que saem do bolso do Adam adulto, por vezes, se mantém em um pano de fundo para algo tão preocupante quanto a finalidade de sua chegada: a trajetória até estacionar em quem é no ano de 2050. Ao enxergar de fora sua realidade, esse mesmo Adam é capaz de perceber o quão frustrado e o quão carente de um núcleo familiar mais sincero e afetivo, é. Logo, o longa-metragem esparrama sensibilidade em um tema que normalmente seria secundário em uma categorizada aventura;  O Projeto Adam adquire uma maior atenção ao passo que caminha honesto durante arcos que lidam com as fases do luto, observado tanto na infância quanto na vida adulta, nas marcas que a condição remanesce, e no questionamento a respeito das escolhas tomadas no decorrer de uma existência. Por isso, a autodescoberta de ambos os Adam influencia em seus “tempos fixos” (onde eles de fato vivem e voltam), dado que a experiência de união dos dois acarreta na indagação de uma série de questões, tal qual a imagem que o garoto tem a seu respeito.

    Netflix/ Divulgação

    Carregando a base dramática e o frisamento nas relações, está Ryan Reynolds e a versatilidade que o ator retém por baixo do tom cômico, igualmente famoso em Deadpool. Em um timing correto, que flutua por um humor sarcástico e um relevante teor de seriedade, o artista auxilia no mantimento da essência do filme, que ainda conta com Walker Scobell interpretando um Adam menor porém semelhantemente debochado e sagaz. O estabelecimento do relacionamento dos protagonistas, devido à química transbordante dos atores, fez-se fácil aos olhos do espectador, que em poucos minutos percebe uma ligação instantânea. Para completar (ou complementar) o elenco principal, Jennifer Garner e Mark Ruffalo, nas posições de pais de Adam, convencem, majoritariamente Garner e seu pesar de ser uma recém mãe solteira. Porém, no lado de antagonista, a vilã de Catherine Keener mostrou-se cada vez mais datada.   

    Ao adotar um visual oitentista, mencionado até nas roupas e adereços do Adam de Walker Scobell, lembrando um De Volta Para o Futuro com pitadas modernas, o trabalho de Shawn Levy adquire uma roupagem de ode a década também na filmagem. A paleta fria e seus vislumbres de cor nas luzes chamativas dos petrechos típicos de uma ficção científica – em especial, as astronaves -, juntamente com a trilha sonora ora de mesma pegada que Guardiões da Galáxia, investindo em canções clássicas (aqui, obviamente, dos anos 80), ora preenchida por uma orquestra monumental; foram uns dos artifícios bem manuseados pelo diretor. Os efeitos visuais e as cenas de luta, uns dos grandes atrativos da produção feita pela Netflix, são competentes à medida que fogem do ordinário; as sequências de ação adotam ângulos inusitados, como de baixo para cima, e os movimentos são fluidos, mas não chacoalhados. E, apesar de prezar por conjunções mais íntimas, o terceiro ato cai em um local previsível ao requerer grandiosidade, abrandando o sentimento de conforto dado pela obra.

    O Projeto Adam empolga e ainda emociona, mesmo sem aparentar (caso seja julgado superficialmente antes de assisti-lo) dispor dessa sensação. A dupla Ryan Reynolds e Walker Scobell consegue transpor da tela para o espectador o choque entre a perspectiva infantil e a visão crescida de um adulto afetada pelas ações posteriores daquela mesma análise inocente. E, embora se faça abalizado sentimentalmente, no lugar de ficção científica, o filme não decepciona ao contrapor o enredo afável com bons eventos em que eram necessários a força física ou as forças supersônicas. Culminando no final das suas 1 hora e 40 minutos, o longa-metragem perde força e se conclui com a obviedade, alterando o resultado final, porém não anulando seu perpassar. Portanto, pode-se dizer que O Projeto Adam não supre a saudade da Era do sci-fi, mas promete ao menos fazer com que estes sejam lembrados com dignidade.  


    Publicidade
    Publicidade
    Sair da versão mobile