Os filmes coming of age sempre carregam a proposta de explorar o processo de amadurecimento, essa transição tão complexa e inevitável entre a infância e a adolescência, ou da adolescência para a vida adulta. É fascinante observar como a origem dessa mudança determina os dilemas enfrentados pelos personagens. Quando um filme aborda a passagem da infância para a adolescência, o foco recai sobre questões como puberdade, primeiras paixões, autoestima e os primeiros embates com dilemas morais.
Por outro lado, em obras que retratam o salto da adolescência para a fase adulta, como Meu Eu do Futuro, o cenário muda completamente. Aqui, as grandes expectativas e ansiedades pelo que está por vir tomam o protagonismo. Surgem perguntas cruciais: O que vou ser? Quem vou me tornar? Quantas conquistas alcançarei? Dominar o mundo será possível? Serei feliz? Essas reflexões, carregadas de um espírito selvagem e entusiasmado, representam o turbilhão emocional que consome os jovens em busca de respostas e identidade. Esse é o charme do gênero: capturar com sensibilidade e autenticidade os dilemas universais de crescer e se descobrir.
Há algo profundamente singular em Meu Eu do Futuro: a forma como coloca passado e presente frente a frente com um futuro marcado pela dor, descrença e cicatrizes. Esse futuro não surge apenas como uma consequência, mas como um espelho que reflete preocupação e arrependimento ao encarar seu próprio passado. O cinema, assim como a arte em geral, tem o poder de gerar experiências subjetivas e únicas, já que cada espectador traz consigo uma bagagem de vivências que dialoga com a obra. No caso deste filme, essa interação parece se intensificar de maneira peculiar, reverberando de formas distintas em diferentes faixas etárias.
Para mim, quem vos escreve — um jovem recém-chegado à vida adulta, lidando com ansiedade e o temor do que está por vir —, a experiência foi bastante emocionante. Meu Eu do Futuro tem uma frontalidade cativante, quase provocativa, que convida o espectador a se colocar diante de suas próprias angústias e esperanças. Para o adulto, o filme pode ser uma oportunidade de reconciliar-se com as experiências do passado, abraçando-as como partes necessárias do percurso, liberando-se das amarguras da dor e da nostalgia. Já para o jovem, é um lembrete visceral de que é preciso viver intensamente: cometer erros, ser ingênuo, experimentar o amor, a dor e o riso com a mesma intensidade.
Afinal, a vida é isso — um emaranhado de emoções contraditórias que nos moldam e, paradoxalmente, nos libertam. Meu Eu do Futuro não apenas narra essa jornada, mas também a encapsula com delicadeza e brutal honestidade. Estamos estruturalmente habituados à ideia de que a vida segue uma linha reta, um caminho previsível e contínuo, como se tudo se desenrolasse em uma velocidade constante, repleta de heróis e vilões perfeitamente definidos. No entanto, a realidade é muito mais complexa. A vida não é uma estrada linear, mas um emaranhado de escolhas e consequências, que nos conduz por uma dança constante entre o “bem” e o “mal”, o “certo” e o “errado”, entre experiências enriquecedoras e outras que nos marcam negativamente.
Vivemos em uma cultura que constantemente nos alerta a evitar erros, a não “fazer besteira”, como se o equívoco fosse algo a ser temido em vez de um elemento essencial da aprendizagem e do crescimento. Esse medo de falhar muitas vezes nos paralisa, fazendo com que nos afastemos da própria vida, evitando riscos e, com isso, perdendo oportunidades. É exatamente sobre isso que Elliot, em sua versão jovem, reflete com uma sabedoria desarmante: “Se não fôssemos jovens e burros, estaríamos trancados dentro de casa.” Essa frase é um lembrete poderoso de que viver é, inevitavelmente, tropeçar, errar e aprender. A juventude, com toda a sua ingenuidade e impulsividade, carrega consigo uma liberdade que é, ao mesmo tempo, perigosa e necessária. Esse estado de ser — viver sem as correntes do medo, ainda que por um breve período — é o que nos permite não apenas existir, mas experimentar a profundidade, a intensidade e a complexidade da vida em toda a sua imperfeição.
O que me encanta em Meu Eu do Futuro é a maneira como o filme abraça o humor, a aventura romântica e o melodrama juvenil para abordar questões profundas, muitas vezes reservadas ao espaço seguro de uma sessão terapêutica. A diretora Megan Park utiliza a linguagem como um espelho, criando uma conexão entre a tela e o espectador. Sua decupagem constitui uma espécie de elo, onde cada enquadramento e cada plano convida o espectador a encarar as protagonistas, as duas versões de Elliot, não apenas como personagens, mas como reflexos de si mesmos.
Esse olhar direto, quase desafiador, transforma o filme em um diálogo íntimo, onde questões como arrependimento, saudade, autocompaixão e o desejo de reconciliação com o passado são exploradas com sensibilidade. É impossível não se sentir interpelado por essas “Elliots”, que, em seus conflitos e vulnerabilidades, espelham as nuances daquilo que é universalmente humano: a busca por sentido, perdão e a coragem de viver plenamente.