ter, 4 novembro 2025

Crítica | No Other Choice

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Man-soo (Lee Byung-hun) é um pai de família amoroso e trabalhador dedicado que é demitido após 25 anos de serviços. No desespero por não conseguir encontrar um novo emprego, decide que a única solução para sustentar sua família é eliminar seus concorrentes de um processo seletivo. Em No Other Choice (Eojjeolsugaeopda), o cineasta Park Chan-wook aborda, com um leve humor ácido, os dramas enfrentados pelo trabalhador médio na Coreia do Sul.

A abordagem fílmica, muitas vezes somado a uma visão tanto poética quanto caótica, dos desafios enfrentados pela classe trabalhadora no cinema sul-coreano – movida não por um desejo pelo capital, mas por uma questão de necessidades maiores que vão do bem estar familiar e honra – é, de longe, uma das mais interessantes para se gerar situações conflitantes que vão se acumulando até formar uma bomba relógio de intensidades, prestes a explodir e entregar desfechos reflexivos e momentos de proporções épicas, tal como o icônico vencedor do Oscar (2020) Parasita, de Bong Joon-ho.

Na linguagem cinematigráfica de Park Chan-wook, esses conflitos desafiadores se fundem a temas variantes da vingança e da violência, como o cineasta já mostrou em sua clássica trilogia – Mr. Vingança (2002), Oldboy (2003) e Lady Vingança (2005) -. Em No Other Choice (Eojjeolsugaeopda), filme de abertura do XV Janela Internacional de Cinema do Recife, o cineasta torna a utilizar os elementos que o consagraram na indústria cinematográfica, juntamente com a necessidade de trazer para o público uma série de debates sobre desemprego, zona de conforto, escolhas e modernidade versus trabalho.

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Imagem: Neon/Reprodução

O enfoque inicial em uma família à lá comercial de margarina, desfrutando o melhor do que seu patriarca colheu em um árduo trabalho na indústria de papéis, gera uma empatia pela batalha do protagonista em tentar dar a volta por cima. Park Chan-wook dispõe de uma estratégica e bem equipada bagagem para se despertar as emoções no público que serão fundamentais para a compreensão da obra. Da trilha sonora banhada pela melancolia das cordas e notas graves de um violoncelo, momentos onde o silêncio predomina o desenvolvimento da narrativa, até a acidez de um humor voltado para a realidade e ao absurdo das situações apresentadas em cena e momentos até então minimamente dramáticos – como a doação dos cães da família, Si-Two e Ri-Two -, que são responsáveis por “dar asas à cobra”, são minuciosamente arquitetadas por Chan-wook e toda a equipe, alavancando a excelência de sua condução de uma tragicomédia prestes a dar um soco no estômago do espectador a qualquer momento.

Na adaptação da obra “The Ax”, do norte-americano Donald E. Westlake, o roteiro de Park Chan-wook, em parceria com Lee Kyoung-mi, Jahye Lee e Don McKellar, ressignifica a problemática do desemprego para a cultura asiática, onde há variadas concepções e atritos referentes à falta de trabalho, assim como a visão da sociedade e das grandes empresas diante a essa questão. Sentindo uma necessidade de se contextualizar, a narrativa acaba por estender o final de seu primeiro ato, até encontrar o momento catártico responsável por aliviar o longa de uma comédia ácida para adotar notas mais complexas de uma tragicomédia banhada em absurdos. A escrita de No Other Choice é cirúrgica em suas analogias e críticas, assim como suscinta nas metáforas e dilemas que complementam a narrativa a ponto de não deixá-la complexa até demais, ou confusa, mas com munição suficiente para se tornar provocativa para o público e testar suas visões à respeito de ética e moral, compromisso e responsabilidade, zona de conforto e a necessidade de se arriscar diante de um mercado dominado pelas máquinas e pela concorrência.

Imagem: Neon/Reprodução

A metáfora da dor de dente enfrentada pelo protagonista Man-soo (Lee Byung-hun) está ligada diretamente à sua condição psicológica, na qual o deterioramento de sua sanidade está interligada ao incômodo bucal de fato sentido pelo seu personagem. Os dilemas também enfrentados pela esposa Miri, interpretada por Son Ye-jin, refletem nas consequências das ações Vegas e desesperadas de Man-soo. Já o drama enfrentado por Bummo, vivido por Lee Sung-min, reflete na triste condição de estagnação e desinteresse em arranjar um outro ofício em áreas semelhantes ou diferentes, gerando uma crítica à questão de “sair da sua zona de conforto”, mostrando o quão árdua e, às vezes, imprecisa essa analogia acaba se tornando. Esses 3 personagens em questão são os que mais nos despertam indagações sobre os brilhantes temas apresentados pelo longa, além de serem trabalhados com maestria pelo roteiro e por seus intérpretes, com destaque para o desespero, que contrasta entre o silencioso e o espalhafatoso, de Lee Byung-hun. Outros grandes nomes presentes no elenco são: Yeom Hye-ran, Cha Seung-won e Park Hee-soon.

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No Other Choice se encaixa como mais um trabalho de excelência de Park Chan-wook, que conduz uma atual e reflexiva tragédia cômica e dramática sobre a desesperada tomada de decisões extremas. É um thriller metafórico que reflete uma problemática, de fato, intrigante e que poderá ter ainda mais valor com o decorrer dos anos.

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Destaque

Man-soo (Lee Byung-hun) é um pai de família amoroso e trabalhador dedicado que é demitido após 25 anos de serviços. No desespero por não conseguir encontrar um novo emprego, decide que a única solução para sustentar sua família é eliminar seus concorrentes de um...Crítica | No Other Choice