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    Crítica | O Estranho

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          Às vezes associamos uma curiosidade genuína sobre o sentido das coisas com a infantilidade. Talvez ao longo da vida, essa sensação de estranhar o que se vê vá se perdendo à medida em que nos acostumamos com o estado atual do que é o mundo, mas talvez esse sentimento perdure e acabe virando uma outra coisa. Seja o motivo do sol aparecer no céu de manhã ou a razão para enchentes acontecerem nas grandes cidades, a vontade de revelar o que há por trás é tão humana quanto qualquer outro aspecto nosso, e nesse sentido O Estranho, de Juruna Mallon e Flora Dias, busca entrar nessa conversa partindo do sentido poético das coisas.

          O filme acompanha Alê (Larissa Siqueira) em uma espécie de cruzada pelo sentido das coisas dentro de um espaço de impermanência. A personagem trabalha dentro do Aeroporto Internacional de Guarulhos, lugar destinado à passagem de pessoas e objetos, um fluxo contínuo de histórias. A sacada aqui é que, a partir dessa rotina, essa história acaba buscando questionar a herança do próprio espaço.

          Atravessando períodos históricos, mas ainda assim buscando repetições, O Estranho, usa de uma série de paralelos e desvios na busca de uma revelação que vem a partir do estranhamento da vida contemporânea. Alê é uma figura que busca por algo que talvez já não exista mais ali mas que de fato já existiu, e a memória que perdura também é atravessada pela constante do espaço. Não é uma constante de forma necessariamente, talvez seja algo como um ambiente que agrega memórias, ou que por vezes as apaga.

          Em certo momento o filme abandona um pouco suas pretensões poéticas em prol de uma abordagem mais direta do registro de memória desse espaço. Entrevistas e depoimentos tomam conta da narrativa como forma de revelar as memórias deste lugar a partir de pessoas reais, quebrando então um compromisso com dramatização, simbologia e contemplação para aproximar essa história da realidade. Essa quebra talvez atrapalhe um pouco o fluxo da obra como um todo e, a partir dessa quebra de unidade, enfraqueça seus segmentos mais poéticos. Independente disso, a mensagem acaba se sobressaindo, dando um sentido maior à obra mesmo dentro dessa desorganização de estilo.

          Essa noção de fluxo é algo que parece importante dentro dessa narrativa, seja pelas recorrentes imagens de fluxos de água, que podem ser pensados também como um exemplo da relação entre passagem e constância, ou pela própria iconografia do aeroporto, como esse espaço de chegadas e partidas programadas. A diferença entre esses dois símbolos acaba ilustrando a crítica que o filme faz à necessidade de apagamento rumo ao suposto progresso, que é acima de tudo uma violência. 

          O Estranho consegue, acima de tudo, construir um relato multifacetado da relação entre o humano e o espaço. Mesmo que um pouco confuso em sua execução, que transita de formatos, esse é um filme que encontra força em diferentes aspectos da memória. Que seja pela sobreposição, repetição ou exposição, parece estar constantemente interessado em investigar seu assunto com alguma paixão. 

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