qua, 20 novembro 2024

Crítica | O Pai de Rita

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Tendo como inspiração a canção lançada em 1966 por Chico Buarque, O Pai da Rita surge majoritariamente como um projeto de visibilidade para uma região tradicional da cidade de São Paulo e menos como uma comédia de caricaturas dos personagens que ali vivem ou um drama sobre a passagem de uma geração para a outra, apesar de tentar. O filme de Joel Zito Araújo retrata o dia a dia de uma dupla de sambistas veteranos que possuem uma história totalmente atrelada ao bairro do Bixiga, à escola de samba Vai-Vai e cuja amizade passa a ser abalada por vícios, o surgimento de uma nova geração de sambistas e a vinda de uma personagem relacionada ao passado de ambos.

Aílton Graça e Wilson Rabelo trazem à vida a dupla Pudim e Roque com muita competência, o fio condutor da narrativa são os dois e se existe um elemento que mantém algum nível de potência até o rolar dos créditos é a conexão destes amigos. Pudim é o retrato de um músico que vive no passado, se remoendo pelas próprias ações e se entregando cada vez mais a hábitos autodestrutivos. Roque já é o lado mais equilibrado entre os dois, sendo a pessoa responsável por manter algum nível de ordem na rotina partilhada pela dupla, passando sempre uma imagem de ponderação.

O filme constrói bem o ambiente que estes personagens povoam e entrega muito tempo de tela a formar esse imaginário do que é ser um morador da Bela Vista, os tipos de pessoas, a cultura, a música, o espaço, entre outros elementos formadores dessa região. Isso está longe de ser um problema uma vez que em sua primeira meia hora de duração existe um esforço da direção e fotografia em tornar estes ambientes em algo de interesse, com uma mística própria e uma personalidade distinta mas a partir da metade do longa tudo começa a ficar cada vez menos inspirado e essa magia inicial se perde para dar lugar a um foco no drama esvaziado que rege o resto da produção.

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O investimento no drama parece desbalanceado e indeciso uma vez que questões que são apresentadas e poderiam ser elaboradas para enriquecer a história são simplesmente simplesmente solucionadas de uma hora pra outra, por exemplo quando é apresentado todo um arco secundário envolvendo a ascensão de um novo sambista na escola que entra em conflito com nossos protagonistas mas o conflito se desvirtua de uma hora pra outra em uma questão do passado de Pudim e então o assunto só é citado novamente ao final do filme onde todo potencial conflito é varrido para debaixo dos panos. O filme ainda possui alguns lapsos de dramaticidade na personagem Neide, vivida por Elisa Lucinda e em Gracinha, vivida por Nathalia Ernesto, mas é pouco para o que é apresentado.

A introdução da personagem Rita vivida por Jéssica Barbosa marca não só o começo dos maiores conflitos entre nossos protagonistas, mas também uma queda na qualificação do que vinha sendo demonstrado em relação à atuação. Rita é facilmente o elo fraco entre os três apesar de servir de gatilho para os pontos de maior investimento no drama que a produção almejava e isso debilita todo o terceiro ato do filme. A diferença de nível se torna discrepante na medida em que personagens de menor expressão para a narrativa geral deixam muito mais impressão quanto a personalidade e expressividade do que essa personagem que é vendida como um dos destaques do longa.

Tudo vai se tornando menos e menos interessante ao ponto de termos uma cena final que cria paralelo direto com a inicial mas todo o contexto dado pela mais de 1 hora e meia de filme não agregam para a sua intensidade e deixa um sentimento de conclusão insatisfatória para uma história que teria algum nível de poder de diálogo com diversas gerações ao falar de paternidade (e a falta dela), a consequência geracional de perpetuar certos hábitos de um ideal masculino, entre outras tantas questões que estão emaranhadas com o contexto do Brasil em suas diversas regiões e culturas mas que podem muito bem ser observadas dentro de uma amostra pequena do país.

O Pai da Rita se torna pouco ousado e desinteressante por boa parte de sua duração. Boas atuações, alguns jogos de cor interessantes e um certo investimento não apagam as suas falhas mas ainda é uma produção muito dentro do que é ofertado pelo cinema nacional nesse âmbito de filmes “populares” brasileiros então provavelmente atingirá seu público de maneira satisfatória apesar de tudo.

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Fabrizio Ferrohttps://estacaonerd.com/
Artista Visual de São Paulo-SP
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