seg, 23 dezembro 2024

Crítica | Os novatos

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Eu particularmente tenho um carinho especial por filmes do gênero coming of age, essas comédias que lançam um olhar sensível e, ao mesmo tempo, irônico sobre a adolescência e suas transformações. O que mais me atrai nesses filmes é quando eles se permitem abraçar o absurdo, transformando o que já é um período de vida turbulento em algo ainda mais exagerado, caricato, quase um teatro do nonsense. Esse exagero muitas vezes resvala no besteirol, o que me diverte bastante. Confesso que tenho saudade de boas comédias adolescentes que sabem trabalhar esse tom. Clássicos como American Pie que fez isso com maestria em seu primeiro filme, assim como Booksmart e Superbad, que conseguiram capturar a essência do caos juvenil com humor afiado e irreverente.

Nesse contexto, vale destacar a estratégia da Netflix, que há anos busca abraçar todos os tipos de gênero cinematográfico, embora nem sempre com sucesso – na maioria das vezes é uma bomba atras da outra. No entanto, se há algo que a plataforma tem feito bem é lidar com narrativas sobre a adolescência. Não por acaso, seus maiores sucessos trazem jovens protagonistas, refletindo essa fase da vida com autenticidade e uma pitada de exagero. O último filme do gênero que me chamou a atenção foi Você Não Está Convidada Para o Meu Bat Mitzvá, que, embora siga uma estrutura mais infantilizada, entrega um humor leve e envolvente. Agora, com Os Novatos, a Netflix parece adentrar no terreno do besteirol, fazendo referências formais a filmes que marcaram o gênero, o que pode agradar aos apreciadores de uma comédia mais escrachada.

Os Novatos é uma comédia que acompanha quatro amigos — Benj (Mason Thames), Eddie (Ramon Reed), Connor (Raphael Alejandro) e Koosh (Bardia Seiri) —, todos calouros recém-chegados ao ensino médio. Eles estão naquele momento crucial da vida em que cada passo parece ser decisivo para moldar sua posição social. Quando são convidados para a primeira grande festa da escola, repleta de veteranos, enxergam a oportunidade perfeita para finalmente se enturmar e viver uma experiência que acreditam ser transformadora. A promessa de uma noite épica, cheia de novas aventuras e reconhecimento social, alimenta a imaginação dos garotos.

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No entanto, o que inicialmente parecia um simples evento adolescente logo se transforma em um verdadeiro campo minado de situações embaraçosas e desafios inesperados. A festa, que deveria ser o ápice de suas vidas escolares, revela-se uma prova de fogo que coloca em cheque suas amizades, inseguranças e o próprio entendimento do que significa “pertencer”. Ao longo da narrativa, a comédia se desenrola através dos dilemas típicos da adolescência – identidade, paixão, reconhecimento, bullying – mas também flerta com o absurdo e o cômico exagerado, elevando pequenos incidentes ao status de grandes catástrofes juvenis.

O que mais me agrada neste filme é a maneira como ele abraça, sem qualquer hesitação, a galhofa característica do gênero adolescente, ao mesmo tempo em que faz referências inteligentes a clássicos do passado. Desde 10 Coisas que Eu Odeio em Você até American Pie, ele encontra uma forma de homenagear essas obras ao mesmo tempo em que se adapta ao gosto e às sensibilidades da nova geração. São os temas centrais da adolescência que todas as gerações passaram, mescladas com os acontecimentos contemporâneos de redes sociais, e telas (muitas telas). Essa habilidade de equilibrar o passado e o presente é um dos seus grandes trunfos, trazendo um toque geracional que ressoa com o público atual.

No entanto, admito que o filme às vezes se perde em meio às suas subtramas, especialmente na forma como elas são decupadas. A montagem, em certos momentos, parece fragmentar a narrativa, dispersando o foco e dificultando a conexão com algumas histórias paralelas. É uma desunião formal mesmo, onde alguns tramas parecem ganhar mais atenção do que outros tornando a experiencia um pouco cansativa. Ainda assim, mesmo com essas “falhas”, o filme consegue se sustentar pela força de suas sequências de besteirol — aquelas cenas absurdas que provocam uma deliciosa vergonha alheia. E, se pararmos para pensar, a essência de ser adolescente é justamente essa: viver momentos embaraçosos, onde o exagero é parte da experiência. É aí que o filme se destaca, capturando com precisão esse caos emocional e social que marca a juventude.

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Caique Henry
Caique Henryhttp://estacaonerd.com
Entre viagens pelas galáxias com um mochileiro, aventuras nas vilas da Terra Média e meditações em busca da Força, encontrei minha verdadeira paixão: a arte. Sou um apaixonado por escrever, sempre pronto para compartilhar minhas opiniões sobre filmes e músicas. Minha devoção? O cinema de gênero e o rock/heavy metal, onde me perco e me reencontro a cada nova obra. Aqui, busco ir além da análise, celebrando o impacto que essas expressões têm na nossa percepção e nas nossas emoções. E-mail para contato: [email protected]
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