seg, 16 dezembro 2024

Crítica | Pacificado

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A princípio a ideia de um “favela movie” – filmes nos quais busca-se retratar o dia a dia nas comunidades – dirigido por um estrangeiro, Paxton Winters, pode soar como a receita perfeita para o desastre. No entanto, surpreendentemente, o diretor americano demonstrou enorme sensibilidade ao evitar filmar com um olhar estereotipado, isso porque Winters morou na favela durante alguns anos e, sendo assim, não era estranho a essa realidade, justamente por isso não trata seus personagens como animais exóticos em um zoológico.

O filme segue a história de Tati (Cássia Gil), uma garota de treze anos que desde nova já sofre as consequências da pobreza e deposita todas as esperanças no retorno de seu pai, Jaca (Bukassa Kabengele – “Carandiru”), que acaba de sair da prisão após 14 anos encarcerado. Antes de ser preso, Jaca comandava o tráfico da favela e seu retorno levanta a dúvida quanto ao seu retorno ao poder, criando-se um cenário de tensão entre ele e o atual chefe.

A narrativa é centrada no microcosmo dessa comunidade, enquanto seguimos os protagonistas, somos apresentados também a outros moradores que tem seus dilemas próprios e precisam recorrer a ajuda dos líderes do tráfico, em uma região abandonada pelo estado. Esse talvez seja o maior trunfo do longa, mostrar os problemas cotidianos enfrentados por essas pessoas à margem da sociedade.  Ao mesmo tempo em que não romantiza aquela realidade, também não a condena. 

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O filme opta por um ritmo mais lento do que estamos acostumados a ver nesse subgênero, algo que funciona muito bem com a ideia proposta, isso permite ao espectador imergir na rotina dos personagens retratados, conhecer as características locais e se interessar pelo futuro daquele povo.

Um problema é que as subtramas secundárias acabam sendo mais interessantes do que as principais que não tem muito a oferecer para um filme de 1 hora e 40 minutos. Após um primeiro ato intrigante, o longa começa a ficar repetitivo, insistindo nas mesmas conversas, sem sair do lugar. Há também uma dificuldade para lidar com o protagonismo dividido entre Tati e seu pai. No terceiro ato, o filme volta a se recuperar e culmina num ápice excelente, cheio de tensão e reviravoltas orgânicas, daquelas que não parecem forçadas para causar choque, mas sim consequências naturais daquilo que havia sido apresentado.

Quanto a parte técnica, se por um lado é louvável o trabalho de fotografia, que não apenas oferece takes belíssimos, mas também auxilia, de fato, na condução da trama, seja para mostrar o tamanho colossal daquela comunidade ou para, em uma determinada cena, deixar o espectador inquieto quanto ao destino de um motorista de caminhão. Por outro lado, a captação de áudio desse projeto é uma das piores coisas que já vi em um filme A (com exceção daqueles propositalmente trash, o que não é o caso), há diálogos completamente inaudíveis que, inevitavelmente, quebram a imersão de quem está assistindo, o que prejudica sobremaneira a experiência.

Enquanto a fotografia consegue contar muito apenas com o poder de sugestão das imagens, quando o filme precisa se valer de palavras, elas não chegam ao ouvido do público. Em geral, a despeito de problemas técnicos e uma quebra de ritmo no segundo ato, a experiência ainda é mais positiva do que negativa.   

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Raíssa Sanches
Raíssa Sancheshttp://estacaonerd.com
Formada em direito e apaixonada por cinema
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