seg, 28 julho 2025

Crítica | Perdido na Montanha

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Em julho de 1939, o jovem Donn Fendler, de apenas 12 anos, escalou uma montanha com sua família e ao chegar no topo, após uma discussão acalorada com seu irmão gêmeo, Donn se perdeu dos demais, durante uma violenta tempestade. Sem comida e equipamentos adequados, ele precisou lutar por nove dias contra as provações da natureza, vencendo o frio e a fome.

Em julho do ano passado, 85 anos depois de sua aventura na montanha, um filme, dirigido por Andrew Kighlinger, que adaptou a história de sobrevivência do garoto estreou no festival de Maine – região dos Estados Unidos onde ele se perdeu. Recentemente, o filme estreou na Netfelix.

Trata-se de uma dramatização dos eventos vividos pelo jovem Fendler, porém utiliza-se também de vídeos reais de depoimentos das pessoas que participaram de sua busca. Esse formato nada usual que mistura técnicas de documentário com a estrutura mais clássica de uma cinebiografia, apesar de diferente da maioria esmagadora dos filmes desse tipo, acabou pesando negativamente. Primeiro porque a diferença tonal dos formatos não foi bem aproveitada pelo cineasta, o que deixou o projeto sem identidade. O resultado final acaba lembrando aquelas reconstruções feitas por programas jornalísticos que são interrompidas por depoimentos dos familiares.  

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E segundo porque – apesar do rico material base – o longa não é muito bom nem como biopic, nem como documentário. Na parte dramatizada, as relações são higienizadas demais, nenhum conflito é propriamente explorado e, mesmo quando tenta dar camadas aos personagens, acaba fazendo isso de forma burocrática, ninguém parece ter nuance nos sentimentos. Quem mais sofre com isso é a mãe que, até nas cenas em que seu descontrole seria justificado, sempre se mostra como uma fortaleza impenetrável de bondade imaculada, com um sorriso a ser oferecido de prontidão. É o pai quem tem mais se aproxima de um ser humano real, imperfeito e com camadas complexas, apesar de não ser ele o foco do filme, acaba sendo sua figura mais interessante.

Quanto a parte mais “documental” do projeto, são usadas as técnicas menos inventivas: pessoas sentadas dando depoimentos sobre acontecimentos que veríamos encenados em tela na cena seguinte. A sensação é de que o diretor fez questão de envolver essas pessoas por respeito e gratidão ao papel fundamental que desempenharam, mas não sabia muito bem como aproveitá-las.

Quando passamos a acompanhar o menino perdido na floresta, o que deveria ser o ápice do filme, acaba se revelando uma suavização drástica dos acontecimentos. Só sabemos da intensidade do perigo graças aos relatos inseridos, porque narrativamente o diretor não faz ideia de como transmitir essa sensação de risco. Talvez na tentativa de deixar o filme com um aspecto mais familiar, o realizador acaba passando a sensação de que qualquer pessoa com o mínimo de preparo físico – o mínimo mesmo – poderia sobreviver sem grandes dificuldades. Nos primeiros dias, o menino parece estar em uma viagem de acampamento na qual seu maior revés é a falta de um repelente. Só ao final é que as coisas parecem ganhar um contorno um pouco mais tortuoso, porém a situação é prontamente resolvida.

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É louvável o esforço do diretor de tentar algo novo, mas ao tentar misturar dois formatos, dos quais não parece dominar nenhum, acabou criando uma obra inexpressiva, cujo único diferencial só funciona na teoria.

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Destaque

Raíssa Sanches
Raíssa Sancheshttp://estacaonerd.com
Formada em direito e apaixonada por cinema
Em julho de 1939, o jovem Donn Fendler, de apenas 12 anos, escalou uma montanha com sua família e ao chegar no topo, após uma discussão acalorada com seu irmão gêmeo, Donn se perdeu dos demais, durante uma violenta tempestade. Sem comida e equipamentos...Crítica | Perdido na Montanha