seg, 30 dezembro 2024

Crítica | Pisque Duas Vezes

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O longa de estreia de Zoë Kravitz é um intrigante suspense que se passa em uma ilha particular paradisíaca, onde coisas estranhas parecem acontecer em meio às festas e bebedeiras, e o que deveria ser um momento de relaxamento para a protagonista, Frida (Naomi Ackie), e sua melhor amiga, Jess (Alia Shawkat), acaba se provando um verdadeiro pesadelo que colocará suas vidas em risco.

Frida e Jess trabalham como garçonetes em bailes de gala da alta sociedade e sonham em desfrutar, ainda que brevemente, da vida boa que levam seus clientes. E ao tentarem adentrar nesse mundo que lhes parece tão distante, Frida acaba despertando o interesse do milionário Slater King (Channing Tatum), o rapaz se mostra doce e prestativo, um verdadeiro príncipe encantado que se encanta pelas garotas e as convida para passar férias em sua ilha particular.

Desde o início, fica evidente para o público que há algo de suspeito com King, sua gentileza parece demasiada e não natural, a necessidade de se mostrar constantemente como um bom homem que se arrependeu de erros do passado e se reinventou com ajuda de seu terapeuta, os sorrisos largos que nunca saem de seu rosto e a maneira de sempre se portar como um cavalheiro, tudo soa extremamente forçado. Mas qualquer suspeita que a protagonista pudesse ter é soterrada pelo mundo luxuoso ao qual ele a introduz, cheio de roupas caras, brunches com mimosas, festas privadas à beira da piscina, jantares de alta gastronomia, tudo regado a álcool e drogas recreativas.

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Além da situação parecer boa demais para ser verdade, a diretora vai plantando pequenas pistas – nem sempre sutis – que indicam que algo está errado naquele lugar, seja através de manchas de sangue que desaparecem magicamente ou uma funcionária que tenta dizer algo para a protagonista sem conseguir se comunicar. A primeira a notar a estranheza é Jess, a amiga tenta, em vão, alertar Frida, que está seduzida demais pelas regalias com as quais não está acostumada a ter e por estar sendo vista como um ser humano pela primeira vez em sua vida. O deslumbre lhe torna cega.

Durante seu desenvolvimento, o filme consegue ser bastante intrigante, gradualmente nos deixando cada vez mais preocupados e curiosos para saber o que está acontecendo, quais as intenções de cada personagem, quem é inocente e quem é conivente e onde aquilo vai chegar. Essa parte de mistério e tensão é bem explorada pela diretora, que apesar da pouca experiência, cria uma atmosfera inquietante. Apesar dos coadjuvantes não serem especialmente carismáticos e não ligarmos muito para eles, a situação é tensa o suficiente para nos importarmos com o resultado e as consequências.

Quando a violência escala, a diretora mostra que não tem medo de sujar as mãos e cria cenas suficientemente gráficas, para que todo o desconforto criado não fosse amenizado, a agressão não é só sugerida, como mostrada e o seu impacto é sentido, em outras palavras, a ameaça não fica apenas no papel. Por sua vez, na hora da retaliação das vítimas, a violência continua gráfica, no entanto perde o ar sombrio para dar lugar a estilização divertida, uma decisão acertada que torna gratificante o acerto de contas, ao vermos os agressores sendo agredidos.

Em meio a decisões certeiras há um deslize provavelmente advindo da falta de confiança de uma iniciante, que não acredita na mensagem de seu longa que já estava clara e insere alguns discursos panfletários demais, com altas doses de expositividade e sem profundidade nenhuma. Veja bem, o problema não é o filme ser feminista – muito pelo contrário – mas sim, a falta de nuance na abordagem. O peso da situação já era sentido, não havia necessidade para mais didatismo raso, que ao invés de tornar a mensagem mais potente, acaba enfraquecendo-a. Infelizmente essa verborragia, somada ao clichê de dar o nome de Frida para sua personagem principal, acaba com qualquer resquício de sutileza, que engrandeceria ainda mais esse projeto.

Não obstante, o filme é uma boa opção para os fãs de suspense e mantém um ritmo bom durante seus primeiros dois terços, terminando em uma nota alta, com um desfecho que abre espaço para discussões. Kravitz faz uma boa estreia na direção e me deixa curiosa para conferir seus projetos futuros.

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Raíssa Sanches
Raíssa Sancheshttp://estacaonerd.com
Formada em direito e apaixonada por cinema
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