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    Crítica | Prenda a Respiração

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    O gênero, além de suas questões diretamente ligadas à própria estética, também encontrou uma forma de lidar com possíveis tensionamentos e questão da época em que foi produzido. Ou seja, se na década de 1980 muitos filmes de terror, por exemplo, passaram a lidar mais frontalmente com a figura do outro, isso vem de uma política de estado neoliberal posta por Reagan; se, em outra abordagem, houve a mudança da Rússia para países do Oriente Médio em seus papéis de vilania, elas se dão pós o 11 de setembro, e assim por diante. A pandemia de Covid-19 foi um desses acontecimentos que a arte cinematográfica tentou entender enquanto as coisas aconteciam e, passados quatro anos, ainda há resquícios dessas abordagens no cinema de horror.

    É claro que Prenda a Respiração (Hold your Breath, dirigido por Karrie Crouse e Will Joines) tenta lidar com questões de maternidade na superfície de tudo, mas a ambiência de um local isolado, com máscaras e um perigo em partículas rondando remete diretamente ao doloroso período pandêmico. A premissa, contudo, é bem simples: em meio às terríveis tempestades de poeira durante os anos 30 em Oklahoma, uma mulher, interpretada por Sarah Paulson, se convence de que uma presença sinistra está ameaçando sua família. Estabelece-se, desde o início da metragem, que a protagonista vive em meio a uma duplicidade mental: enquanto tenta lidar com o luto de ter perdido sua filha mais nova, ela tenta defender suas outras duas crias no meio da tempestade.

    Mais a frente, apresenta-se a ideia do Homem Cinzento, que se dissolveria em poeira, tomando posse do corpo da pessoa e a fazendo cometer crimes terríveis. Ora, posto esses dois caminhos, o filme já se estabeleceria solidamente como um thriller psicológico. Contudo, contra ele, existem dois pontos. O primeiro é que este filme parece ter sido lançado fora de uma temporalidade que o pudesse transformar em um lançamento maior. Em outras palavras, pode-se enumerar algumas narrativas recentes que dão conta de tramas semelhantes – o monstro muda, mas em alguns pontos bebe diretamente de Um Lugar Silencioso ou o próprio Never Let Go, lançado este ano, protagonizado por Halle Berry, parte de situações similares. E quando pode ousar na estética ou na construção do suspense, parece muito arraigado a tudo o que é produzido na contemporaneidade dentro dos serviços de streaming – ainda que a ideia inicial tenha sido um lançamento nos cinemas.

    Eis então seu segundo problema, associado diretamente à forma e ao conteúdo e já explicitado no início desse texto. Caso o filme caminhasse apenas para o lado do exercício de gênero, talvez ele pudesse crescer de alguma forma, mas a sensação que fica é que ele está o tempo todo tentando caber em uma noção política, revestindo-se de pautas contemporâneas, enquanto exercita seu suspense de forma comedida ou óbvia. Se Paulson é uma mulher frágil mentalmente, não há qualquer desejo em brincar com a existência dos personagens porque se deixa claro quais as posições de cada; se um tiro acontece, já se sabe o encaminhamento porque é tudo tão frágil nas ambições, que a surpresa só existe dentro da própria diegese.

    E isso não seria um problema caso o filme não tentasse fazer de cada gesto de Paulson uma dica para o que acontecerá no clímax. Ou seja, o filme falha em tentar abrigar tensionamentos atuais, falha no exercício de gênero, falha na própria composição de sua mitologia, restando apenas a competente entrega de Sarah Paulson que, ainda que esteja presa a alguns tiques de seus trabalhos com Ryan Murphy, se mostra uma atriz muito consciente de sua entrega. No final, o título do projeto se torna uma antítese do próprio filme. Não há como prender a respiração com um filme que parece não se importar com essa atitude na construção fílmica.

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