ter, 16 abril 2024

Crítica | Sombras de um Crime

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Na primeira metade do século XX, histórias de detetive se popularizaram de forma impressionante. O sucesso de romances envolvendo tramas policiais, gângsters, investigadores de moral ambígua entre outras figuras que habitam o imaginário da criminalidade urbana nos EUA ajudou a estabelecer alguns personagens que viriam a ser adaptados diversas vezes para o cinema e, no caso de Sombras de um Crime, estamos lidando justamente com um destes expoentes: o investigador particular Philip Marlowe. Adaptando o romance The Black-Eyed Blonde de John Banville que retoma as aventuras de Marlowe anos depois da morte de seu autor original, Raymond Chandler, Sombras de um Crime traz Liam Neeson no papel do protagonista e parece sempre autoconsciente dessa escolha.       

O filme acompanha a investigação de Marlowe sobre o desaparecimento do amante de uma herdeira, Clare Cavendish, que bate à sua porta. Estamos lidando aqui com o final dos anos 30, a Segunda Guerra Mundial está em seus primeiros momentos, os bastidores da indústria do cinema, clubes de alta sociedade e os seus segredos são o contexto. A produção faz um bom trabalho de caracterização do período na maioria das cenas mesmo levando em conta que é uma história relativamente contida, é possível perceber a utilização de computação gráfica em algumas tomadas amplas mas a estilização de algumas cenas que ejeitam um realismo nessa representação do passado acabam funcionando por focar na sensação que essa antiga e soturna Los Angeles passa.      

Liam Neeson convence como personagem principal, sem excessos. A questão da sua idade pode levar a um estranhamento inicial mas tanto o texto quanto a fisicalidade do ator acabam justificando a escolha do protagonista em um filme que por vezes beira a metalinguagem ao retratar a insistência do ator em representar esse arquétipo do homem imparável que resolve os problemas no soco ou na bala. O filme parece sempre ir se adequando à Neeson para cada situação de estranheza, o que pode inclusive tirar a suspensão de crença de alguns.   

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O mistério que a princípio parece simples acaba se desdobrando em mais e mais cenários, o que poderia ser interessante, se o ritmo e os diálogos tivessem sido melhor ajustados para justificar essa continuidade. Existem alguns poucos personagens interessantes para preencher a história, dando destaque para a atriz veterana Dorothy Quincannon, mãe de Clare, mas parece haver também uma superficialidade na caracterização da maioria dos coadjuvantes que acaba tornando a história um tanto caricata. O desenvolver da trama vai cada vez mais perdendo seu peso dentro dessa estrutura de gênero que parece não saber o que trazer como novidade ou ponto de interesse para além do básico.

Se estamos lidando com os valores de uma história de detetive, ainda mais falando de marlowe com sua série de aventuras episódicas, é comum que o personagem não mude tanto entre o começo e o fim da história, ou seja, aqui não é possível delimitar um arco claro de desenvolvimento do protagonista, o que não necessariamente é um problema, mas quando o mistério se esvazia, não existe um personagem que carrega energia para mover a história e a caracterização contida do detetive acaba ampliando o desinteresse que se cria no ato final. 

Sombras de um Crime é mais um de muitos neo-noirs porém sem a inventividade de reestruturar as batidas do gênero ou a competência de se apegar nessas batidas com um entendimento do que faz elas funcionarem dentro de uma experiência fechada. A marca de Neeson e alguns bons momentos acabam não salvando o filme de ser esquecível.

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Fabrizio Ferrohttps://estacaonerd.com/
Artista Visual de São Paulo-SP
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