O Volume 2 da quinta temporada de Stranger Things deixa uma sensação clara: a série sabe exatamente onde quer chegar, mas nem sempre sabe como caminhar até lá sem se repetir. Os episódios 5, 6 e 7 funcionam como um longo corredor narrativo que conduz diretamente ao episódio final, apostando menos em impacto imediato e mais em preparação emocional. O problema é que, nesse caminho, o roteiro começa a expor rachaduras que antes passavam despercebidas sob o peso enorme da série.
Há emoção, há entrega do elenco e há um cuidado estético inegável. Mas também há escolhas narrativas excessivamente seguras, explicações demais e uma sensação incômoda de que a série confia menos na inteligência do público do que já confiou um dia.
Atuações fortes tentando sustentar um texto irregular
O elenco continua sendo o principal amortecedor das fragilidades do roteiro. Eleven (Millie Bobby Brown) entrega uma atuação mais silenciosa e introspectiva, demonstrando maturidade artística. O problema não está nela, mas na maneira como o texto frequentemente a empurra para a lateral da própria história. Em vez de permitir que sua personagem conduza conflitos, o roteiro parece ocupado demais explicando regras e conceitos, reduzindo o impacto emocional de suas cenas. Mas o faz também pois desde o volume anterior, Will se torna o protoganista.
Will Byers (Noah Schnapp), por outro lado, finalmente recebe um arco com densidade emocional real. Sua atuação é uma das mais honestas do volume, trabalhando nuances internas em vez de grandes gestos. É um desempenho que evidencia um contraste desconfortável: quando o roteiro para de explicar e passa a sentir, a série funciona muito melhor.
Max (Sadie Sink) mantém o nível elevado que já se tornou padrão. Mesmo quando o texto insiste em alongar situações ou revisitar sentimentos já explorados, a atriz consegue sustentar o peso dramático com naturalidade. Ainda assim, há momentos em que sua presença parece mais simbólica do que narrativa, um reflexo direto da dificuldade da série em equilibrar um elenco numeroso.
Steve, Dustin, Nancy e Jonathan seguem carismáticos, mas presos a uma engrenagem que gira em falso. São personagens queridos, mas nem sempre necessários. Em vários momentos, suas participações soam como obrigação contratual ou apego emocional do roteiro, não como necessidade dramática real.
É no roteiro que Stranger Things 5 – Volume 2 mais se fragiliza. A série parece tomada por um medo constante de deixar qualquer coisa subentendida. Diálogos explicam o que a imagem já mostrou. Personagens verbalizam sentimentos que poderiam ser transmitidos com silêncio. Conceitos são reiterados à exaustão, como se o público tivesse esquecido tudo o que aprendeu ao longo de quatro temporadas.
Esse excesso de exposição compromete o ritmo. Os episódios são longos, mas nem sempre densos. Há cenas que se arrastam não por profundidade emocional, mas por repetição de informações. Em vez de tensão crescente, o que se constrói é uma espera cansada, não pela resolução, mas pelo momento em que a série finalmente avança.
Alguns furos de lógica interna também começam a se destacar. Decisões convenientes demais, regras que parecem flexíveis conforme a necessidade do episódio e soluções narrativas que funcionam mais por insistência do roteiro do que por coerência do universo. Nada chega a destruir a história, mas o acúmulo desses detalhes enfraquece a suspensão de descrença, especialmente para quem acompanha a série com mais atenção.
Ainda assim a espaço para inúmeras referências e easter eggs nos episódios. Cenas que remetem diretamente a falas e personagens de filmes como E.T., Star Wars, Deu a Louca nos Monstros, Parque dos Dinossauros e tantos outros, agradam e muito saudositas dos anos 80 e 90 (como eu). Aliás, são tantas referências, que devam merecer uma matéria a parte só para comentá-las.
Direção e fotografia tentando esconder as costuras
Visualmente, Stranger Things segue impecável. A fotografia é sofisticada, com uso expressivo de sombras, enquadramentos fechados e uma paleta que reforça o clima de encerramento. A direção aposta em cenas longas e contemplativas, claramente interessada em dar peso emocional ao que está sendo dito.
O problema é que, em alguns momentos, essa elegância visual parece funcionar como uma cortina bonita escondendo problemas estruturais. A direção segura cenas que o roteiro não sustenta. A estética tenta criar profundidade onde o texto oferece apenas repetição.
Os efeitos visuais continuam impressionantes e, em geral, melhor dosados do que em temporadas anteriores. Quando surgem, cumprem um papel narrativo claro. Ainda assim, há sequências em que o impacto visual parece competir com o desenvolvimento dramático, criando uma sensação de grandiosidade vazia.
Pequenos erros de continuidade e escolhas questionáveis de lógica visual também chamam atenção, especialmente em uma série que sempre foi celebrada pelo cuidado com detalhes. São falhas pequenas, mas simbólicas de um projeto que cresce tanto que começa a perder o controle de si mesmo.
Um volume que pede paciência, que neste ponto, não queremos ter
O Volume 2 não tenta ser explosivo. Ele se assume como preparação. O problema é que essa preparação exige paciência constante do espectador, sem oferecer recompensas proporcionais ao longo do caminho. A série quer que o público chegue emocionalmente pronto ao episódio final, mas às vezes parece confundir profundidade com lentidão.
Há emoção genuína aqui. Há carinho pelos personagens. Mas também há uma clara dificuldade em abrir mão do passado e avançar com coragem narrativa.
Stranger Things 5 – Volume 2 é tecnicamente refinado, emocionalmente honesto e narrativamente excessivamente cauteloso. Quando confia nos atores e na força dos personagens, acerta. Quando tenta explicar demais, tropeça. Quando revisita ideias já resolvidas, enfraquece seu próprio impacto.
Ainda assim, como peça de transição, cumpre sua função: posiciona todas as peças para o encerramento. Resta agora saber se o episódio final terá coragem de fazer o que este volume evitou: arriscar de verdade.


