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    Crítica | Zé

    Drama biográfico sobre líder do Movimento Estudantil Brasileiro aposta na sensibilidade e escanteia lutas importantes

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    No drama biográfico Zé, acompanhamos a luta de José Carlos Novaes da Mata Machado, líder do Movimento Estudantil Brasileiro e participante de um grupo de resistência contra a ditadura militar no Brasil que, durante a clandestinidade, realizou trabalhos de alfabetização e conscientização política dos mais pobres, até ser traído por um companheiro e morto pelo regime repressivo, no Recife.

    Existe um grande desafio em mãos quando uma produção escolhe por realizar uma obra inspirada na vida de um importante nome da história do nosso país de maneira mais intimista, apostando numa sensibilidade por vezes excessivamente romantizada, mas que, em certas ocasiões, funcionam e agregam uma carga dramática necessária para a trama. Apesar de estar prezando pelo sensível, , de Rafael Conde, acaba tornando a história de vida e luta de José Carlos Novaes da Mata Machado, líder estudantil e dirigente da Ação Popular Marxista-Leninista contra a ditadura militar, uma adaptação simples e um tanto retida, porém com boas intenções.  

    Deixando uma tímida martirização da figura do personagem título em evidência ao focar nas suas idas e vindas, além dos diversos problemas e perigos que ele enfrentou durante sua perseguição, o roteiro de , sob a autoria de Anna Flávia Dias Sales e do próprio Rafael Conde, investe no introspectivo e na luta silenciosa de seu protagonista, ao lado de sua companheira, Bete/Madalena, e seus filhos. Inspirado no livro homônimo de Samarone Lima, o ritmo da escrita, ora lento, ora surpreendentemente sufocante devido a inteligentes mecanismos narrativos que ilustram a situação aterradora da qual os personagens estão passando por meio de sutilezas e minimalismos, contribui com a abordagem mais humanizada da obra.

    Bem alimentado pelo teor humano e social da narrativa, o drama e a representação da figura de José Carlos são bem construídos, apesar da linguagem implicar no caráter imersivo da produção. Além de adotar um tom que procura se dispersar da tensão do período da ditadura militar, apostando mais para o lado emocional e nas lutas internas do que numa visão mais abrangente da luta armada, escolhe tratar questões importantes referentes ao contexto histórico como um mero plano de fundo. Sua clandestinidade em Estados do Nordeste, por exemplo, está presente na trama, porém faltou um aprofundamento nos seus feitos durante esse período, como no processo de alfabetização de famílias mais humildes e conscientização sobre a política do Brasil. A partir do terceiro ato, a tensão dos anos de chumbo consegue ser potencializada, quando vem à tona a traição praticada pelo cunhado e companheiro de luta de Zé, Gilberto, e a prisão de vários de seus colegas, em representações curtas, porém que conseguem gerar impacto.

    Imagem: Embaúba Filmes

    Há uma sensação de que a cinebiografia retém feitos importantes e que não houve um uso adequado de suas duas horas de duração, devido a falta de subtramas, imposições ou até mesmo um pingo de liberdade artística, que chega a ser bem vinda em determinadas ocasiões. Talvez, uma explicação plausível para a simplicidade da produção esteja, além da escolha por um drama natural e humanizado, o desejo de não replicar dramas históricos que tendem a extrapolar na representação de acontecimentos e de figuras importantes.

    Da simplicidade se gera uma sutileza que está bem presente em Zé, principalmente quando avaliamos o ótimo rendimento do jovem elenco. Caio Horowicz se doa para atribuir serenidade, desejo por liberdade e perseverança do seu José Carlos, além de convencer em leituras de cartas escritas pelo seu personagem que funcionam como interessantes sequências de quebra de quarta parede. Eduarda Fernandes, Samantha Jones, Rafael Protzner complementam o elenco com atuações competentes, belas e, tal como o filme, naturais.

    Imagem: Embaúba Filmes

    É perceptível uma melancolia transmitida pelos enquadramentos e direção de fotografia, assinada por Luís Abramo, em . A escolha de tons menos saturados, que puxam para um opaco e sombras, dão uma sensação de tristeza ou de perda, uma forte alusão à luta precocemente interrompida do protagonista. Com planos bem centralizados e fechados nos personagens em cena, que permitem planos sequência longos e bem filmados, o longa-metragem ostenta de uma bela identidade visual, ainda mais quando observamos a sutileza dos cenários e figurinos que remetem às décadas de 1960 e 1970.

    Sensível e sem grandes intenções de ousar, faltou a um aprofundamento mais detalhado de sua militância e uma abordagem mais abrangente de seus feitos. Por outro lado, é da sensibilidade que vem a beleza da obra, que consegue comover e encantar devido aos seus excelentes atores em cena.

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