Em seu início, Pânico já estabelece uma conexão direta com o fã de terror. Quando Ghostface liga para nossa eventual protagonista, Casey (Drew Barrymore), e faz literalmente um jogo de vida ou morte usando perguntas de alguns dos filmes Slashers mais famosos. Com o protagonismo quase que definido, o público é surpreendido com a morte da moça, tudo isso em menos de 10 minutos de filme. Em algo muito parecido com Psicose de Alfred Hitchcock, a personagem é brutalmente assassinada, e a atriz mais famosa do elenco é descartada logo de cara no filme. Um prólogo inesquecível, e o início de uma das franquias de terror mais influentes do cinema.
Uma pequena e pacata cidade no interior do estado da Califórnia no ano de 1995, está em Pânico. Um serial killer, fanático por filmes de terror, está assassinando brutalmente todos os jovens da cidade. Primeiro ele liga para sua vitima, e faz perguntas sobre filmes de terror. Se sua vitima errar, ele invade sua casa e a mata a facadas. O problema é que ninguém sabe quem pode ser o assassino, já que ele usa uma máscara de fantasma (Ghostface) e um facão para abrir suas vitimas de cima a baixo.
Na segunda metade dos anos 90, o subgênero Slasher estava em decadência. Personagens como Jason Vorhees, Michel Myers e Freddy Krueger (do mesmo diretor) estavam descaracterizados, com inúmeras sequências inexpressivas. Wes Craven empenhado em modernizar o gênero e subverter expectativas cria Pânico, uma espécie de sátira com comentários do gênero terror, que permanecem atuais até os dias de hoje, não diferente, teve um recente Reboot e uma continuação já anunciada. Cada personagem de Pânico parece recorrente no gênero, mas aqui eles são abastecidos com diálogos surpreendentemente inteligentes, que servem como comentários ácidos sobre as convenções do cinema feito para chocar e assustar. São comentários tão divertidos de se assistir, brincando com os famosos clichês do gênero, o protagonismo de alguns filmes com adolescentes, tudo isso permanece atemporal, com longas parecidos sendo lançados até hoje.
Somos apresentados a Sidney Prescott (Neve Campbell), uma jovem que viveu um trauma recente devido ao assassinato de sua mãe, um ano antes. A personagem virou ícone do subgênero, uma verdadeira Final Girl. Interessante notar a forma como o filme trata a relação vítima e assassino. Em filmes antigos como Sexta feira 13, o personagem persegue a moça indefesa com bastante facilidade, para ao final da perseguição acabar matando-a tranquilamente (ainda mais se tratando de um ser imortal). Aqui é diferente, as vítimas constantemente lutam na perseguição, jogam objetos, chutam, socam. Em algumas cenas a sensação é de humilhação para o Ghostface, totalmente vulnerável, ainda mais por se tratar de um ser humano normal (e ainda adolescente!), mas em grande parte ele consegue realizar o assassinato, mesmo depois de socos e chutes de sua vítima. Essa humanização do assassino é soberba, combina demais com o tema tragicômico do filme. Talvez o maior equilíbrio do cinema entre comédia e horror esteja presente nessa franquia.
O longa apresenta um primor em seu fator principal: descobrir quem é o assassino. Por conta da alta quantidade de personagens, o risco de se tornar um problema era perigoso, mas com o esqueleto do filme facilmente identificável, isso se torna uma espécie de brincadeira para o público. Quanto mais personagens, mais possibilidades para o telespectador tentar adivinhar quem está cometendo os crimes. Não diferente, durante o filme, os mesmos brincam com essa possibilidade, procurando motivações entre seus amigos, e trazendo um metalinguagem interessante para a obra, uma identificação quem está assistindo. O fator replay do filme é excelente, mesmo após já sabermos quem cometeu os crimes, a sensação de assistir de novo e ligar os pontos da trama é sensacional.
Outro ponto interessante é a cobertura sensacionalista, representada pela personagem Gale Wheaters (Courtney Cox), que não se importa com o derramamento de sangue durante o filme, apenas com furos de notícia em primeira mão. Atitudes bastante atuais com as inúmeras tragédias recorrentes até os dias de hoje. Pessoas que forçam conexão emocional com o ocorrido, mas só se importam com a audiência. É evidente notar que a personagem de Gale não possui um desenvolvimento de personagem, apenas seu envolvimento até o final (em Pânico 2 ela finalmente teria um arco desenvolvido). Existe um pequeno trecho da imprensa do filme que evidencia muito bem esse argumento sensacionalista do filme, a repórter notícia o assassinato, e logo em seguida (enquanto segura a máscara do Ghostface) faz a pergunta: quem é o próximo?
Pânico é a desconstrução do clássico, mas sem esquecer a importância do mesmo para o gênero. Possui uma autoconsciência, os personagens sabem muito bem como as coisas funcionam, mas isso não adianta em nada. Sidney crítica a moça inocente e burra que sobe as escadas ao invés de sair pela porta da frente, mas no final das contas ela acaba fazendo o mesmo. A nova geração é estabelecida por Wes Craven, o bombardeio de imagens é representado na maior franquia de terror de todos os tempos.