qui, 30 janeiro 2025

Resenha | Álbum Debí tirar más fotos

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Para minha felicidade, pude sentir de perto a influência do boca a boca e do marketing na recepção do novo álbum de Bad Bunny. Confesso que nunca havia prestado atenção ao cantor porto-riquenho e, muito provavelmente, continuaria alheio ao seu trabalho se não fosse minha recente paixão por explorar a música ao redor do mundo. Foi nessa jornada impulsionada pela efervescência das redes sociais que me deparei com um dos álbuns mais marcantes de 2025. Debí Tirar Más Fotos chegou logo no início do ano, mas não tenho dúvidas de que estará presente nas listas de melhores discos ao final dele.

A América Latina pulsa com força, cultura e identidade. Se tenho orgulho de ser pernambucano, ele se faz tão presente quanto o orgulho de ser latino. Nascemos da resistência, da força de uma classe historicamente marginalizada desde a invasão branca e europeia. Debí Tirar Más Fotos carrega essa energia profundamente latina, mas, acima de tudo, essencialmente porto-riquenha. Se eu, como latino, me senti representado, imagino o impacto para um porto-riquenho. É um álbum enraizado em suas origens, vibrante na maneira como traduz sua identidade para os batimentos intensos. O mais interessante é como a regionalidade, o amor e a identidade transbordam de forma tão autêntica que tornam este álbum de Bad Bunny distinto de qualquer outro dentro do gênero.

Mas, para além dessa força latina, há uma leveza cativante nas faixas. Canções que falam sobre viver, registrar, celebrar, lutar, pertencer e ocupar espaço. Letras intensas, entrelaçadas a um ritmo dançante que desperta o lado mais visceral do ouvinte. São fusões marcantes de uma cultura que passeia pelo reggaeton — um estilo mais contemporâneo — e dialoga com a salsa e o tango, gêneros clássicos da identidade latina. Quando o som bate, o corpo sente, e poucas coisas me agradam mais do que músicas que não apenas envolvem a mente, mas também movimentam o corpo. Debí Tirar Más Fotos faz isso de forma única. Faixas como NUEVAyol e VOY A LLEVARTE PA PR são exemplos claros desse impacto físico — garanto que será impossível ouvi-las sem se deixar levar pelo ritmo.

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Mas há algo aqui que me encanta particularmente: a maneira como Bad Bunny, mesmo com a força vocal e textual de suas letras, consegue divertir o ouvinte. Suas composições são profundamente políticas, abordando com contundência o imperialismo norte-americano, que há décadas invade, consome e rouba tudo o que Porto Rico tem a oferecer. Bad Bunny transforma a musicalidade porto-riquenha, naturalmente dançante, em um impacto sociocultural impressionante — algo especialmente significativo nos dias atuais, em que a indústria musical parece cada vez mais mergulhada na genericidade, na chamada “tiktokzação” da arte.

E é justamente nessa “tiktokização” da música que Bad Bunny encontra um equilíbrio entre o moderno e o clássico. Ele utiliza os próprios mecanismos da indústria cultural para alcançar os mais jovens — muitos, assim como eu, que pouco conheciam a fundo a cultura latina e, a partir deste álbum, passaram a se interessar mais por suas próprias raízes. Isso é especialmente significativo para nós, que há tanto tempo vivemos sob a sombra do imperialismo norte-americano, a ponto de, muitas vezes, nos sentirmos estrangeiros dentro da nossa própria identidade. Ao mesmo tempo, ele também resgata a memória dos mais velhos. Basta olhar as redes sociais para ver vídeos de pais e mães que nunca se conectaram com os trabalhos anteriores de Bad Bunny, mas que se identificam com este novo som. Debí Tirar Más Fotos é um álbum profundamente enraizado em sua cultura, e é justamente essa autenticidade que faz dele um marco.

Nós, latinos, carregamos uma característica cultural belíssima: a união e a fraternidade intensas. Protegemos os nossos, recebemos com calor e alegria, e temos a incrível capacidade de chamar de família aqueles que estão sempre ao nosso lado, mesmo sem laços sanguíneos. Talvez, por estarmos historicamente diante do estrangeiro, nossa maior força sempre tenha sido a união. Uma classe unida é capaz de resistir e enfrentar qualquer forma de opressão imperialista. Talvez seja essa trajetória que nos fortaleceu enquanto povo latino. E é por isso que, quando Bad Bunny canta sobre tirar mais fotos, dar mais beijos e abraços, sinto uma vontade indescritível de estar com os meus, de celebrar suas conquistas, histórias e vidas. São obras como Debí Tirar Más Fotos que me fazem redescobrir o prazer de viver, mesmo em tempos difíceis. A arte tem esse poder.

Portanto, Debí Tirar Más Fotos é o álbum de um artista que, por muito tempo, esteve sob as chamas destrutivas do imperialismo, dominado pelo estrangeiro e, em certo ponto, desconectado de suas próprias raízes. Mas o tempo o fez lembrar de onde veio, e é fascinante acompanhar esse processo de redescoberta. Para escrever este álbum, Bad Bunny contratou um historiador especializado em Porto Rico — um gesto que evidencia sua vontade genuína de compreender suas origens. Afinal, não há maneira mais profunda de se entender e se redescobrir do que olhar para trás, para o solo que nos moldou. Bad Bunny finalmente se encontrou. E, ao longo dessa trajetória, ajudou muitos outros a fazerem o mesmo. Unindo o novo ao clássico, ele não apenas faz história, mas dá voz a um povo que, há séculos, resiste a invasões e apagamentos culturais. Para mim, Debí Tirar Más Fotos já pode ser considerado o álbum mais impactante, dançante e popular do ano.

VIVA AO POVO LATINO! CONTRA LA BURGUESÍA EUROPEIA E NORTEAMERICANA!

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Caique Henry
Caique Henryhttp://estacaonerd.com
Entre viagens pelas galáxias com um mochileiro, aventuras nas vilas da Terra Média e meditações em busca da Força, encontrei minha verdadeira paixão: a arte. Sou um apaixonado por escrever, sempre pronto para compartilhar minhas opiniões sobre filmes e músicas. Minha devoção? O cinema de gênero e o rock/heavy metal, onde me perco e me reencontro a cada nova obra. Aqui, busco ir além da análise, celebrando o impacto que essas expressões têm na nossa percepção e nas nossas emoções. E-mail para contato: [email protected]