qua, 28 maio 2025

Crítica | A Lenda de Ochi

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Ambientado nas montanhas dos Cárpatos, A Lenda de Ochi (The Legend of Ochi) é uma aventura dramática que conta a história de amizade improvável entre uma menina solitária, Yuri (Helena Zegel), e um filhote de um animal folclórico local, conhecido como Ochi, temida pelos habitantes da região, principalmente por seu pai, Maxim, (Willem Dafoe), que treina um exército de jovens para abater os monstros. Quando encontra um bebê Ochi machucado na floresta, a garota descobre uma conexão entre ela e a criatura e não hesita em ter que enfrentar o medo e o ódio dos seres humanos com o desconhecido para ter que levar o seu novo amigo mágico de volta para casa.

 A influência da A24, que é, sem dúvidas, uma das produtoras de cinema independente mais notáveis da última década, é capaz de fazer com que o filme mais desprovido de grandes ideias seja visto como uma obra interessante apenas por carregar o poderoso selo do renomado estúdio. Se aventurando em uma linha tênue entre agradar um público consumidor de um cinema mais artesanal e independente e os amantes de um mainstream disfarçado de obra autoral, a produtora se vê com as portas abertas para investidas inéditas que venham a agradar novos espectadores. A Lenda de Ochi (The Legend of Ochi), por exemplo, é uma obra que parece ter saído da saudosa onda de fantasias sombrias infanto-juvenis com evidentes cargas dramáticas que refletiam no comportamento e o amadurecimento de crianças e adolescentes em fases conflituosas da vida, nas décadas de 80, 90 e 2000. Ciente dessas influências e da necessidade de se fazer algo acessível aos fiéis consumidores de seu entretenimento e ao novo público que pretende conquistar, a A24 procura mergulhar em um storytelling à moda antiga para desenvolver sua aventura fantástica que flerta com o drama de amadurecimento, em uma produção de emoções verdadeiras, mas que tardam a funcionar.

 Ambientado nas cadeias montanhosas e geladas dos Cárpatos, A Lenda de Ochi se desenvolve por meio de louváveis referências, tendo como a maior delas clássicos da Amblin Entertainment, de Steven Spielberg, como E.T.: O Extraterrestre – talvez, seu maior inspirador – e até mesmo Os Goonies, porém sob uma plenitude quase silenciosa, onde é possível observar, através de uma calmaria melancólica que se dá pelas temáticas da narrativa e sua ambientação idílica das montanhas da Romênia, uma temática de dores e amadurecimentos acessível a todos os públicos. Nesta estreia do cineasta Isaiah Saxon como diretor e roteirista de um longa-metragem, é perceptível seu entusiasmo em expor suas referências e procurar resgatar um subgênero, há muito necessitado de inovações, com uma visão mais pé no chão e introspectiva. Também é possível associar a obra de Saxon a muitos elementos das animações Lilo e Stitch (2002) e Como Treinar o Seu Dragão (2009), cujo os remakes em live-action são as grandes apostas da Disney e DreamWorks para 2025 e, já que ambas dispõem da essência de uma história emocionante envolvendo crianças solitárias e uma criatura fantástica com quem ela estabelece uma profunda amizade, pode escantear fantasia experimental da A24. Mesmo com recursos formais a postos para fazer seu longa de estreia brilhar, o realizador parece perdido em seus próprios conceitos. Enquanto a trama demora chegar a algum lugar prometido pela premissa, a narrativa também se encontra sob a dependência de soluções rápidas e repentinas, parecendo não acreditar em seu potencial, ou pretendendo simplesmente escapar de investidas ousadas e criativas para se destacar.

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 Amalgamar temáticas de amadurecimento, repressão familiar, abandono, o encontro com o desconhecido e sua compreensão, além de a necessidade de embarcar em uma jornada de autoconhecimento, em apenas 1 hora e 35 minutos, e mesmo quando não se há ricos investimentos no desenvolvimento de temas tão importantes para deixar um filme infanto-juvenil de fora da superficialidade, não foi uma tarefa fácil para a edição de Paul Rogers, que também se encontra necessitada de inspiração e ritmo na hora de o filme focar na história.  

Imagem: A24/Reprodução

Em tempos de redes sociais e inovações tecnológicas como forma de doutrinação e controle comportamental de jovens e adolescentes, é interessante que A Lenda de Ochi tenha colocado o medo do desconhecido proveniente da ignorância de uma figura paterna, representada com maestria por Willem Dafoe, como fonte do doutrinamento de jovens, treinados desde a infância a temer e odiar as indefesas criaturas que vivem no universo da narrativa. No entanto, essa é mais uma ideia louvável do roteiro assinado pelo próprio realizador da obra, Isaiah Saxon, que mal é aprofundada ao longo da trama, se encaixando somente como uma apresentação bem elaborada que merecia um maior desenvolvimento, tal como as relações entre a protagonista Yuri e sua mãe, Dasha (Emily Watson), que a abandonou para estudar os Ochis e para fugir da repressão de seu marido, Maxim (Dafoe). A escrita de Saxon escolhe por navegar em águas rasas e planícies pacíficas, o que torna o filme demasiadamente simplório para um enredo e referências tão louváveis, sendo gradativamente subvertida pela ambientação e direção sóbria do realizador, que une a ficção fantasiosa a conflitos psicológicos e morais que espelham um combate contra intolerâncias e doutrinações.

 De fato, Saxon consegue dirigir os atores em cena, até mesmo aqueles com pouco tempo de tela e quase nenhuma relevância à trama, como Petro, de Finn Wolfhard. Com maior tempo de tela, Helena Zengel, intérprete de Yuri, consegue passar as variadas emoções de sua protagonista, além de conceber uma relação altamente natural com o boneco animatrônico utilizado para dar vida a Ochi, sendo este um dos pontos mais positivos do filme, além da técnica impecável de efeitos visuais práticos para tornar a criatura realista e, ainda assim, animada sem parecer artificial ou demasiadamente mecânico, contando com uma equipe liderada pelo veterano marionetista Robert Tygner (Labirinto, 1986).

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Imagem: A24/Reprodução

 Grande acerto foi utilizar a mistura de animações em stop-motion, animatrônicos e efeitos digitais em chroma-key, todos de grande qualidade, para ilustrar o filme e tornar sua fantasia imersiva. Há momentos em que os limites da produção são evidentes, como a proximidade da câmera em planos fechados nos Ochis, mas que nada afetam o quão minucioso foi o trabalho técnico para o visual das criaturas, com foco no Bebê Ochi, que é um dos protagonistas do filme. Somado à fotografia analógica de Evan Prosofsky, que exalta a paisagem montanhosa e fria da Romênia com belos planos abertos com foco nos coloridos capazes de aparecer em regiões frias, A Lenda de Ochi conta com um visual que responde à altura o uso desenfreado da inteligência artificial no cinema, com efeitos visuais práticos e imagens geradas por lentes vintage.

  Rápido e parcialmente desprovido de grandes emoções ou de uma característica particular em sua história que não dependesse inteiramente de suas boas referências, A Lenda de Ochi se sobressai no visual, entregando um dos trabalhos de fantasia cinematográfica mais bonitos dos últimos anos. Apesar dos escorregos da narrativa, o filme chega a ser uma interessante aquisição ao cinema de entretenimento infanto-juvenil com conteúdo.

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