O cinema de assalto, ou heist movie, é um subgênero que fascina por sua precisão quase cirúrgica e pelo jogo de inteligência entre personagens, espaço e tempo. Mais do que a simples encenação de um roubo, ele é, muitas vezes, um exercício de formalismo narrativo, onde a estrutura importa tanto quanto os próprios personagens. Em sua essência, esses filmes operam como um quebra-cabeça: a montagem da equipe, o planejamento detalhado, a execução milimétrica e, por fim, o desfecho — quase sempre com algum tipo de reviravolta. Cada peça tem uma função dramatúrgica muito clara, e é nessa lógica funcional que o gênero encontra sua força.
O heist movie nasce, de certa forma, da obsessão pelo controle: o plano precisa ser perfeito, os movimentos são cronometrados, o fracasso geralmente decorre de uma falha humana — uma vaidade, uma hesitação, uma traição. É um cinema da tensão constante, onde o espectador, mesmo conhecendo a fórmula, se vê preso pelo timing, pela montagem paralela, pelo modo como a câmera acompanha, quase coreograficamente, a movimentação dos corpos e o desenrolar dos acontecimentos. Há, inclusive, uma espécie de prazer visual na simetria do caos: tudo está à beira do colapso, mas o filme sustenta essa corda bamba com elegância.
Plano Perfeito (2006), dirigido por Spike Lee, é um daqueles filmes que compreendem profundamente as engrenagens do gênero de assalto — não apenas no que tange ao plano criminoso, mas na forma como estrutura um jogo psicológico entre personagens e espectador. É um filme que opera em camadas: o roubo como superfície, a tensão racial e social como subtexto, e uma mise-en-scène que constantemente desafia o olhar e a leitura do público. Há, ali, um domínio claro da linguagem, uma câmera que observa com atenção e uma direção que compreende que, muitas vezes, o que não é dito pesa mais do que qualquer ação explícita.

Plano Perfeito 2, por outro lado, tenta revisitar essa proposta, mas o faz de forma tão burocrática e mal elaborada que parece não entender o próprio DNA da obra original. A estrutura está lá: o jogo de gato e rato, o confinamento em um único espaço, a tensão crescente entre assaltantes e policiais. Mas tudo parece automatizado, esvaziado de qualquer pulsação real. É como se o filme reproduzisse a forma sem compreender o espírito — um simulacro de thriller, que se veste com os códigos do gênero, mas não sabe o que fazer com eles.
A direção de M.J. Bassett é visivelmente insegura. Falta ritmo, falta densidade, falta olhar. A câmera se movimenta sem propósito claro, sem estabelecer atmosferas, sem criar o mínimo de tensão dramática. A decupagem soa genérica, como se seguisse um manual visual, mas sem qualquer sensibilidade ao tempo cênico ou ao suspense. O que deveria ser um thriller psicológico de alta voltagem se transforma em um exercício mecânico de repetição de fórmulas — uma colagem de momentos que parecem não conversar entre si.
O grande problema, no entanto, não está nos clichês. Clichês são ferramentas — cabe ao autor decidir como usá-lo. E Plano Perfeito 2 opta, infelizmente, pela via mais fácil: utiliza o que já foi consagrado dentro do gênero de assalto, mas sem reinventar, subverter ou sequer tensionar seus limites. O resultado é um filme que, apesar de prometer um jogo narrativo, entrega apenas um passatempo esquecível, sem impacto estético ou emocional. É a prova de que, no cinema de gênero, não basta ter a fórmula — é preciso saber como e por que usá-la.